É PECADO SER
HOMOSSEXUAL?
Raimundo Pinheiro
Ultimamente, temos recebido muitos e-mails,
solicitando-nos esclarecimento acerca de como o Espiritismo encara as questões
do homossexualismo e do pecado. Um deles, em especial, despertou a atenção,
porque o amigo remetente, referindo-se à sua atração física por indivíduos do
mesmo sexo, faz-nos as seguintes indagações:
"É
pecado ser homossexual?"; "Por que sou isso?"; "Que pecado
cometi para sê-lo?"; "Até quando serei assim?"; "Se olhar
para um rapaz, com carinho, estarei pecando?"; "Se eu gostar de um
rapaz, com amor verdadeiro, serei pecador?".
Na
missiva eletrônica, ele acrescenta ter sido interno de um seminário, tempo em
que andava sob forte depressão. E que teria abandonado a escola eclesiástica.
Dir-se-ia,
pelas suas palavras sinceras e humildade, que o amigo foi um seminarista bom,
mas não muito bom seminarista, porquanto não se fez clérigo nem sacerdote, e
agora tornou-se espírita. Coisas do existir...
Diz-se
que o pecado é a transgressão de preceito religioso (leia-se, dogma). Sendo
aquele que o pratica, pecador e ou pecante. O pecador, tem certos defeitos ou
vícios; e o pecante, é aquele que peca habitualmente ou que tem baldas
(manias). Podendo,um e outro, pelo arrependimento e confissão de sua culpa, e
através do ritual da penitência (sacrifícios), conseguir a remissão dos pecados
e a comutação da pena eterna. A julgar por esse catecismo, pelo procedimento
das pessoas atualmente, muitas penitências serão necessárias para a
transformação moral da Humanidade.
Ainda,
segundo a "interessante" cartilha cristã, há pecados para todos os
gostos, conquanto haja punições ao gosto de todos os confessores e procuradores
divinos.
Há os
pecados veniais, considerados leves, perdoados sem a necessidade da Santa
Comunhão (confissão), bastando, tão somente, que se reze um Ato de Contrição.
Há os
pecados capitais: a soberba, a avareza, a luxúria, a ira, a gula, a inveja e a
preguiça, que têm dado muito suor e trabalho a São Miguel Arcanjo, no
Purgatório, para levar as almas sofredoras para o Céu. Estes, dependendo da
vontade firme do praticante, podem se transformar em pecados mortais, para
alegria do Maligno.
Há,
finalmente, os temíveis pecados mortais, aqueles que afastam o pecador da Graça
Divina, sem direito a indulgências. Dando-lhe, de imediato, passaporte
carimbado para o inferno, cujo fogo eterno o queima sem o consumir (?), e
causam-lhe a "morte espiritual".
Cultuamos
o hábito diário de ler a Bíblia há 35 anos. Ficamos impressionados com os pregadores
da Bíblia como sendo a palavra de Deus, que a tudo condenam sem misericórdia.
Parecem-nos molecotes analfabetos apregoando jornais, de cujo noticiário não se
podem inteirar. O amor do próximo e a caridade não lhes interessam, a não ser
como recurso extremo: a salvação.
Há
hora em que devíamos ter o prazer pecaminoso de arremeter-nos contra eles a
sapateá-los. Infelizmente, não podemos fazer sempre ao que aspiramos.
Parafraseando
o imortal Tenório D'Albuquerque, perguntar não ofende: Em qual tabelionato foi
reconhecida a firma, da assinatura de Deus, na procuração passada a esses
pastores viperinos, para deliberarem sobre o destino das almas? Onde estarão
aqueles religiosos que nos agrediram com gritos proclamadores da excelência
desta ou daquela penitência? Extraordinária, a facilidade com que proferiram
tantas tolices. Uma fertilidade incomparável! Ignorância imaculada.
O
nosso estimado confrade, Divaldo Franco, certa feita, asseverou com muita
propriedade: "Proibir e condenar, é sempre uma forma contraproducente de
examinar uma questão existente, que merece orientação, educação e
esclarecimento."
Para
a "Santa Igreja" e "evangélicos", o pecado mortal do
homossexualismo é um dos "imperdoáveis", porque profana o corpo, que é o templo de Deus (1Cor, 3:9).
A
palavra pecado tem origem no vocábulo grego "imartia", que significa
afastar-se da meta. Portanto, bem diferente de como é concebida pelas igrejas
ditas cristãs.
Nós,
espíritos, somos seres perfectíveis, dotados de inteligência e livre arbítrio,
porém responsáveis diretos pelas conseqüências de nossas atitudes. Através da
pluralidade das existências corpóreas, caminhamos rumo à meta imutável da lei
divina: a perfeição. Quando nos afastamos do caminho, afastamo-nos dessa meta,
gerando o que chamamos de mal. Todavia, quando retornamos ao caminho, pela
mudança de conduta ou reparação das faltas cometidas, restabelece-se a harmonia
e o mal deixa de existir. Onde haja o bem, o mal desaparece.
Muitos
estudiosos afirmam que a homossexualidade é uma opção do ser humano. Alguns
discordam, alegando que nenhuma pessoa se sentiria feliz por ser perseguida ou
discriminada. Uns, asseveram que ela é orgânica, ou seja, a pessoa não teria
outra alternativa. Já outros, apelam para o emocional: o homossexualismo seria
efeito de algum trauma. E o Espiritismo, que diz?
O
espírito não tem sexo. O mesmo espírito pode animar ora um corpo masculino, ora
um corpo feminino. Cada sexo, como cada posição social, lhe proporciona o
ensejo de adquirir experiência. O corpo não lhe é mais do que um invólucro
perecível de que se serve para se esclarecer e se purificar. Sempre de modo
progressivo, jamais regressivo. Desde que cessa a vida do corpo, ele o abandona
e retorna à pátria legítima, o mundo invisível, ou mundo espiritual. Em um
desses estágios, como homem ou mulher, o abuso que faça do uso das funções
sexuais, acarretará o seu reingresso na lide carnal, no sexo oposto.
"Quando
o homem, em muitas ocasiões, tiraniza a mulher, furtando-lhe os direitos e
cometendo abusos, em nome de sua pretensa superioridade, desorganiza-se ele
próprio a tal ponto que, inconsciente e desequilibrado, é conduzido pelos
agentes da Lei Divina a renascimento doloroso, em corpo feminino, para que, no
extremo desconforto íntimo, aprenda a venerar na mulher sua irmã e companheira,
filha e mãe, diante de Deus. Ocorrendo idêntica situação à mulher criminosa
que, depois de arrastar o homem à devassidão e à delinqüência, cria para si
mesma terrível alienação mental para além do sepulcro, requisitando, quase
sempre, a internação em corpo masculino, a fim de que, nas teias do infortúnio
de sua emotividade, saiba edificar no seu ser o respeito que deve ao homem,
perante o Senhor."
Aparentemente,
esse processo parece uma punição, mas não é. Deus não perdôa nem castiga. A
iluminação dos sentimentos é que o exige.
"A
Humanidade progride, por meio dos indivíduos que pouco a pouco se melhoram e
instruem", já dissera Kardec.
A
prática da homossexualidade não transforma o ser em pessoa abominável. Conhecemos
homossexuais que se distinguem pela inteligência apurada, pela cultura
aprimorada, pela educação exemplar, pela fraternidade cristã e, principalmente,
pelo caráter reto. Conhecemos, também, heterossexuais que mais parecem uma
gruta vazia e sombria. Grande e florida por fora, por dentro, um deserto de
qualidades.
O
homossexual, de ambos os sexos, tem sido condenado ao esquartejamento moral e
violentado, psicológica e fisicamente, por gente maldosa, sem qualquer
fundamento sério. Para nós, espíritas, serão sempre nossos irmãos amados, tanto
quanto os demais, credores do nosso maior respeito e carinho. Dito isto,
passamos a responder as indagações, do querido amigo:
"É
pecado ser homossexual?"
R - Não. Também não é uma escolha ideal, mas o
amigo não deve sujeitar-se ao jugo dogmático das igrejas.
"Por
que sou isso?"
R - Por livre e espontânea vontade. Da mesma
maneira que poderá deixar de ser.
"Que pecado cometi para sê-lo?"
R - Nenhum. O pecado, ou melhor, o sentimento
de culpa só existe na consciência de quem se sente culpado.
"Até
quando serei assim?"
R - Até quando quiser. Se dispuser-se e puder
controlar seus impulsos
carnais,
transferindo as energias sexuais para um trabalho de auto reeducação, melhor.
Sua indômita força de vontade poderá vencer todos os obstáculos, superar todos
os problemas, possibilitando-lhe uma vida saudável. A felicidade conquistada
será o galardão de seus esforços. Deus instituiu leis que nos favorecem a
todos, já dizia o nosso saudoso Chico Xavier.
"Se
olhar para um rapaz, com carinho, estarei pecando?"
R - Não. Desde que esse olhar não seja de
modo lascivo. Um olhar carinhoso, uma palavra fraterna, um sorriso sincero, uma
ação solidária, são ingredientes que alimentam as verdadeiras amizades,
tornando-as indesuníveis.
"Se
eu gostar de um rapaz, com amor verdadeiro, serei pecador?".
R - Já disséramos, anteriormente, que o
pecado está condicionado à atitude mental de cada um, com base no sentimento de
culpa. Quanto ao amor verdadeiro por outro alguém, requisitamos a palavra
autorizada e benevolente do nosso irmão e Benfeitor Espiritual, cuja orientação
bondosa serve para todos nós:
"Recomendar-lhe
a castidade quando as pessoas se degradam em ligações clandestinas, nos braços
de amantes, seria temeridade e hipocrisia. Você faria, dentro em pouco, o que
elas fazem. Sobre a ignomínia da culpa, a ignomínia da mentira.
Daí,a
audácia do meu conselho. Se puder resistir à sua carne, aos seus nervos
rebeldes, aos seus sentidos alarmados, resista. Será heróico e sublime. A
tranqüilidade de sua velhice será o prêmio dessa renúncia na mocidade.
Se,
porém, não encontrar na própria alma energias para vencer o corpo, eleja um
cônjuge. Faça-o, entretanto, publicamente. Nada de subterfúgios, de mistérios,
de clandestinidade. Funde, com ele, um lar. A noção da responsabilidade
assumida em público fá-los-á, a um e a outro, cautelosos na escolha,
assegurando-lhes, assim, a honestidade e a duração da ventura. Amores
escondidos são amores transitórios. Amante que foge, é amante substituído. E
quando alguém adota esse regime, o amor perdeu o seu nome. Chama-se
prostituição.
O meu
conselho é, como se vê, prudente e humano. Você é livre e quer ser feliz.
Faltam-lhe as grandes forças interiores, as poderosas energias mentais, que neutralizam
os gritos da carne e dos nervos, e elevam a pessoa acima do seu sexo,
purificada da animalidade comum. Evite, todavia, em quaisquer circunstâncias, a
pessoa que não quiser, em público, assumir os encargos do seu destino. A casa
de família em que se entra escondido, deixa de ser um lar para ser um
prostíbulo. E a pessoa, que vai encontrar-se secretamente com outra, perde o
seu título de honrada para tomar o de meretriz. Aquela pessoa que não fizer um
sacrifício igual ao seu, abandonando tudo, e tudo afrontando, para viver ao seu
lado, deve ser tomada, simplesmente, como sedutora vulgar e covarde, semelhante
aos rufiões que exploram as mulheres na sombra, desfrutando as vantagens e
fugindo às responsabilidades. Repila, em suma, o amante. E aceite o cônjuge.
Para
doença tão grave, era este, o remédio menos venenoso que havia em minha
farmácia.” Humberto de Campos.
Mais
uma vez, parafraseando o grande Tenório: A beleza dos ensinamentos do
Espiritismo é inexata, não se exprime por números, não se calcula
matematicamente. É de tal magnitude que se torna incalculável, apenas a
sentimos.
E,
para encerrarmos, recomendamos a todos, permaneçamos no amor de Jesus, sem nos
aventurarmos a discriminar ou denegrir o próximo. Permitir a liberdade plena é
o fundamento maior do amor cristão, haurido na nossa Doutrina Espírita.
Muita paz.
Acervo Virtual Espírita.
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