PRIMEIRA
PARTE
FATORES
DE PERTURBAÇÃO
2 A rotina
A natural transformação social, decorrente dos efeitos da ciência
aliada à tecnologia a partir do Século XIX, impôs que o individualismo
competitivo pósrenascentista cedesse lugar ao coletivismo industrial e
comunitário da atualidade.
A cisão decorrente do pensamento cartesiano, na dicotomia do corpo e
da
alma, ensejou uma radical mudança nos hábitos da sociedade, dando
surgimento a uma série de conflitos que irrompem na personalidade humana e
conduzem a alienações perturbadoras.
Antes, os tabus e as superstições geravam comportamentos
extravagantes, e a falsa moral mascarava os erros que se tornavam fatores de
desagregação da personalidade, a serviço da hipocrisia refinada.
A mudança de hábitos, no entanto, se liberou o homem de algumas
fobias e mecanismos de evasão perniciosos, impôs outros padrões comportamentais
de massificação, nos quais surgem novos ídolos e mitos devoradores, que
respondem por equivalentes fenômenos de desequilíbrio.
Houve troca de conduta, mas não de renovação saudável na forma de
encarar-se a vida e de vivê-la.
De um lado, a ciência em constante progresso, não se fazendo
acompanhar por um correspondente desenvolvimento éticoespiritual, candidata-se
a conduzir o homem ao niilismo, ao conceito de aniquilamento.
Noutro sentido, o contubérnio subjacente, apresenta um elenco
exasperador de áreas conflitantes nas guerras e ameaças de guerras que se
sucedem, nas variações da economia, nos volumosos bolsões de miséria de vária
ordem, empurrando o homem para a ansiedade, a insegurança, a suspeição
contumaz, a violência.
A fim de fugir à luta desigual — o homem contra a máquina — os
mecanismos responsáveis pela segurança emocional levam o indivíduo, que não se
encoraja ao competitivismo doentio, à acomodação, igualmente enferma, como
forma de sobrevivência no báratro em que se encontra, receando ser vencido,
esmagado ou consumido pela massa crescente ou pelo desespero avassalador.
Estabelece algumas poucas metas, que conquista com relativa
facilidade, passando a uma existência rotineira e neurotizante, que culmina por
matar-lhe o entusiasmo de viver, os estímulos para enfrentar desafios novos.
Rotina é como ferrugem na engrenagem de preciosa maquinaria, que a
corrói e arrebenta.
Disfarçada como segurança, emperra o carro do progresso social e
automatiza a mente, que cede o campo do raciocínio ao mesmismo cansador,
deprimente. O homem repete a ação de ontem com igual intensidade hoje; trabalha
no mesmo labor e recompõe idênticos passos; mantém as mesmas desinteressantes
conversações: retorna ao lar ou busca os repetidos espairecimentos: bar, clube,
televisão, jornal, sexo, com frenético receio da solidão, até alcançar a
aposentadoria..
Nesse
ínterim, realiza férias programadas, visita lugares que
o desagradam,
porém reúne-se a outros grupos igualmente tediosos e, quando chega
ao denominado período do gozo repouso, deixa-se arrastar pela inutilidade
agradável, vitimado por problemas cardíacos, que resultam das pressões
largamente sustentadas ou por neuroses que a monotonia engendra.
O homem é um mamífero biossocial, construído para experiências e
iniciativas constantes, renovadoras. A sua vida é resultado de bilhões de anos
de transformações celulares, sob o comando do Espírito, que elaborou
equipamentos orgânicos e psíquicos para as respostas evolutivas que a futura
perfeição lhe exige.
O trabalho constitui-lhe estímulo aos valores que lhe dormem
latentes, aguardando despertamento, ampliação, desdobramento.
Deixando que esse potencial permaneça inativo por indolência ou
rotina, a frustração emocional entorpece os sentimentos do ser ou leva-o à
violência, ao crime, como processo de libertação da masmorra que ele mesmo
construiu, nela encarcerando-se.
Subitamente, qual correnteza contida que arrebenta a barragem, rompe
os limites do habitual e dá vazão aos conflitos, aos instintos agressivos,
tombando em processos alucinados de desequilíbrios e choque.
Nesse sentido, os suportes morais e espirituais contribuem para a
mudança da rotina, abrindo espaços mentais e emocionais para o idealismo do
amor ao próximo, da solidariedade, dos serviços de enobrecimento humano.
O homem se deve renovar incessantemente, alterando para melhor os
hábitos e atividades, motivando-se para o aprimoramento íntimo, com consequente
movimentação das forças que fomentam o progresso pessoal e comunitário, a
benefício da sociedade em geral.
Face a esse esforço e empenho, o homem interior sobrepõe-se ao
exterior, social, trabalhado pelos atavismos das repressões e castrações,
propondo conceitos mais dignos de convivência humana, em consonância com as
ambições espirituais que lhe passam a comandar as disposições íntimas.
O excesso de tecnologia, que aparentemente resolveria os problemas
humanos, engendrou novos dramas e conflitos comportamentais, na rotina
degradante, que necessitam ser reexaminados para posterior correção.
O individualismo, que deu ênfase ao enganoso conceito do homem de
ferro e da mulher boneca, objeto de luxo e de inutilidade, cedeu lugar ao
coletivismo consumista, sem identidade, em que os valores obedecem a novos
padrões de crítica e de aceitação para os triunfos imediatos sob os altos
preços da destruição do indivíduo como pessoa racional e livre.
A liberdade custa um alto preço e deve ser conquistada na grande
luta que se trava no cotidiano.
Liberdade de ser e atuar, de ter respeitados os seus valores e
opções de discernir e aplicar, considerando, naturalmente, os códigos éticos e
sociais, sem a submissão acomodada e indiferente aos padrões de conveniência
dos grupos dominantes.
A escala de interesses, apequenando o homem, brinda-o com prêmios
que foram estabelecidos pelo sistema desumano, sem participação do indivíduo
como célula viva e pensante do conjunto geral.
Como profilaxia e terapêutica eficaz, existem os desafios propostos
por Jesus, que são de grande utilidade, induzindo a criatura a dar passos mais
largos e audaciosos do que aqueles que levam na direção dos breves objetivos da
existência apenas material.
A desenvoltura das propostas evangélicas facilita a ruptura da
rotina, dando saudável dinâmica para uma vida integral em favor do
homemespírito eterno e não apenas da máquina humana pensante a caminho do
túmulo, da dissolução, do esquecimento.
O Homem Integral
DIVALDO PEREIRA FRANCO
DITADO PELO ESPÍRITO JOANNA DE ÂNGELIS
GRUPOS UNIVERSO ESPÍRITA
- 16 9 97935920 - 31 8786-7389
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