SERVIÇO
ESPÍRITA DE INFORMAÇÕES
*LUIZ ANTONIO MILLECCO*
Antonio
Lucena
Tarefa
difícil resumir em palavras a figura carismática de Luiz Antonio Millecco Filho,
companheiro cuja falta da visão física não foi capaz de obstar a vontade de fazer
com que o mundo à sua volta se tornasse um lugar melhor. Uma de suas principais
lutas – pelos direitos dos portadores de deficiência visual – estava ligada à
sua própria história de vida, iniciada em 30 de junho de 1932, no Rio de
Janeiro. Cego de nascença, sentiu pessoalmente todas as dificuldades com que os
deficientes visuais são obrigados a conviver, dificuldades que se tornam ainda
maiores – mas não intransponíveis – quando vivenciadas dentro de um lar pobre,
como o que, carinhosamente, o acolheu.
Último de
cinco filhos, perdeu seu pai, Luiz Antonio Millecco, quando tinha apenas dois
anos e meio de idade. Lutadora, sua mãe, Rosa de Carvalho Millecco, assumiu a
casa e garantiu o sustento familiar com o próprio suor, trabalhando como
costureira, doceira e cabeleireira. Diante desse exemplo de força e dignidade,
o jovem Millecco foi consolidando sua personalidade e desenvolvendo, frente às
adversidades, o espírito de luta que o levaria a se tornar uma das figuras mais
dinâmicas dentro do movimento espírita do Estado do Rio.
Os primeiros
contatos com a Doutrina dos Espíritos aconteceram aos 16 anos de idade. A sua
principal fonte de informações, já que praticamente não havia literatura
espírita em Braille, era o rádio. Através dele, acompanhava os programas de
Geraldo de Aquino e Nelson Batista de Azevedo. As primeiras manifestações
mediúnicas ocorreram em 1952, quando já havia se tornado também órfão de mãe.
Nessa mesma ocasião conheceu o então General Mário Travassos (mais tarde
Marechal), que passou a acompanhá-lo à Rádio Copacabana, para onde redigia e
apresentava páginas no programa “De irmão para irmão”. Junto desse novo amigo,
e com Marcus Vinícius Telles, cego do Instituto Benjamin Constant, instituição de
ensino para os deficientes visuais, pôde dar asas a um antigo sonho seu: propiciar
aos cegos, dentro e fora do país, o estudo do Espiritismo através do sistema Braille.
E dessa forma, em 30 de junho de 1953, foi fundada a Sociedade Pró-Livro Espírita
em Braille, a Spleb, sob a presidência de Mário Travassos e a vice-presidência de
Millecco e de Telles.
Com a Spleb
abriu-se um novo leque de possibilidades para os cegos espíritas.
Em 1957, por
ocasião do centenário de “O Livro dos Espíritos”, a entidade lançou em Braille
“O que é o Espiritismo”, de Allan Kardec, o primeiro livro espírita do mundo grafado
nesse sistema, e que teve, como todas as publicações posteriores da entidade, distribuição
gratuita.
Além da
Spleb – que até hoje prossegue em sua benemérita tarefa, no número 51 da Rua
Tomás Coelho, no bairro da Tijuca, Zona Norte do Rio, editando livros espíritas
e não-espíritas de interesse dos cegos – Millecco foi um dos fundadores do
Grupo Universalista Os Cireneus, de socorro espiritual e material a famílias carentes;
foi também co-fundador do TeleCristo, serviço de atendimento fraterno via
telefone; e, ainda, membro do conselho deliberativo da Fundação Cristã Espírita
Cultural Paulo de Tarso, mantenedora da Rádio Rio de Janeiro, da qual era
redator e apresentador dos programas “Ecos da terra nova”, “Estudo dinâmico da
Doutrina Espírita” e “A voz da Spleb”.
Millecco
atuou de forma igualmente expressiva junto ao Instituto Benjamin Constant,
onde iniciou seus estudos em 1946 e, em 2003, presidiu o 1o Congresso Internacional
de Cegos Espíritas. Millecco era professor de Ensino Especializado, cargo que
ocupou até sua aposentadoria, no Instituto Oscar Clark, onde ingressou, em 1960,
na Secretaria Geral de Saúde e Assistência.
Luiz Antonio
Millecco publicou treze livros: “O lado oculto do folclore brasileiro” (1987),
“Meu além de dentro e de fora” (1988), “Reflexões no meu além de fora” (1989),
“Cartas a um sacerdote” (1990 – escrito em parceria), “Vivências – vol. I” (1992),
“Vivências – vol. II” (1993), “O canto da vida” (1996), “Ecos de São
Bartolomeu” (1998), “Embainha tua espada” (1999), “Doze passos rumo à paz
interior” (2000), “É preciso cantar” (2001 – em parceria), “Música e
Espiritismo” (2002 – acompanhado do CD “Canção de Deus”) e “Olhos de ver – o
desafio da cegueira” (2004), comentado nesta edição do SEI.
Musicoterapeuta
graduado pelo Conservatório Brasileiro de Música, no Rio de Janeiro, em 1975,
trouxe contribuições também para o campo da musicoterapia. Criou a primeira
técnica brasileira de trabalho clínico musicoterapêutico, denominada “Músico-verbal”.
De sua autoria constam cerca de 200 músicas.
Com relação
à vida familiar, Millecco casou-se duas vezes. A primeira, no dia 23 de março
de 1968, com Iza de Oliveira Millecco, também cega, que, além de esposa, transformou-se
em grande amiga, dando-lhe pleno incentivo nas lides espiritistas.
Com ela,
teve dois filhos: Magali, que desencarnou poucas horas após o nascimento, e
Luiz Cláudio, que herdou do pai não só o gosto pelo Espiritismo como pela música
(Millecco desde cedo aprendeu a tocar “de ouvido” flauta, cavaquinho, gaita, sanfona,
entre outros instrumentos).
Após a
desencarnação de Dona Iza, casou-se com Maria de Fátima Rossi, com quem viveu
dias igualmente felizes.
Luiz Antonio
Millecco foi hospitalizado no dia 4 de fevereiro, já bastante debilitado pelo
câncer com o qual lutava há algum tempo. Sua desencarnação ocorreu no dia 5,
sendo seu corpo sepultado no dia seguinte, no Cemitério São Francisco Xavier, no
Caju, onde compareceram mais de 500 pessoas que, à saída do féretro,
homenagearam sua memória com uma salva de palmas.
“(...)
Quando, porém, nos abrimos aos influxos positivos de dentro e de fora de nós,
então, vivemos o verdadeiro Natal: o Cristo nasce em nosso ser e leva-nos ao encontro
do próximo, tornando o que seria apenas uma data festiva num acontecimento solene,
para o ano todo e para toda a eternidade”. Assim encerrou Luiz Antonio Millecco
seu último artigo para o SEI, publicado em 4 de dezembro, falando sobre o
Natal.
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