Dalmo Duque dos Santos
Andragogia é a prática educativa iniciática que, desde
remotíssimos tempos, vem sendo utilizada em núcleos filosófico-religiosos. Ela
visa, sobretudo, a formação de agentes multiplicadores (discípulos) de uma
determinada doutrina.
A iniciação, como técnica didática, é idêntica no que
diz respeito à sua essência educativa e varia somente nas suas aplicações
culturais, sendo comum tanto nas mais simples práticas primitivas tribais até
as mais sofisticadas instituições sacerdotais. O pagé indígena, o feiticeiro ou
curandeiro tribal, o padre católico, o pastor protestante, o xamã, o bruxo, o
mago, o gurú, o pai-de-santo, a rezadeira ou benzedeira, todos são iniciados em
suas respectivas áreas de conhecimento, obedecendo princípios e regras
educativas necessárias ao exercício de suas funções ou papéis.
Nas civilizações teocráticas da Antiguidade oriental
esse tipo de prática educativa foi predominante porque a camada sacerdotal
tinha grande influência social e política. O sacerdócio era um status
diferenciado e altamente prestigiado nessas sociedades.
A introdução da educação iniciática oriental no mundo
ocidental se deu através do contato da civilização greco-romanos com as
culturas do Egito, da índia e da China. Sábios gregos como Heródoto, Platão e
Pitágoras freqüentaram núcleos iniciáticos orientais. Mas a própria metodologia
de ensino de Sócrates (a maiêutica e a ironia) funciona como um processo de
iniciação no qual o discípulo tinha que romper barreiras e obstáculos para
vencer etapas de aprendizagem. De todos esses sábios do Ocidente, Pitágoras foi
o que mais se destacou nesse setor , criando uma escola iniciática de grande
prestígio na qual se ensinava ao mesmo tempo o conhecimento racional , o
fenomenal exterior (exotérico) e o fenomenal interior ou emocional (esotérico).
A Matemática pitagórica tanto abrange o aspecto racional do universo (geometria)
como o aspecto místico, como a teoria da perfeição numérica centenária.
Na Idade Média, em plena Era Metafísica, a educação
iniciática, voltou a ser praticada nos círculos de elite, como contestação e
alternativa ao monopólio cultural teológico da Igreja (ordens religiosas em
mosteiros e conventos).
Nessas sociedades secretas ocultistas os homens cultos
e inquietos se reuniam para aprender e desenvolver conhecimentos proibidos. A
Maçonaria é um exemplo desses núcleos, cuja origem foi a corporação de ofício
dos pedreiros ou construtores ( do francês “masson” ou fazedor de massa).
Na Renascença essas sociedades secretas se propagaram
em função do relativo clima de liberdade estabelecidos em cidades comerciais e
pelas revoltas contra os abusos de poder do clero católico (Reformas). Nomes famosos
como Galileu, Leonardo Da Vinci, Rafael, Miguelangelo foram iniciados nos
mistérios metafísicos dessas escolas esotéricas e deixaram transparecer em suas
obras os reflexos desses conhecimentos.
Com o advento do iluminismo e das Revoluções Liberais
as escolas iniciáticas perderam muito da sua influência por causa do
estabelecimento das liberdades civis. Mesmo assim, sabe-se que muitos desses
movimentos foram pensados e tramados em núcleos iniciáticos ou pelos seus
ex-alunos.
No mundo contemporâneo, com as crises existenciais
geradas pelo clima de incerteza, a escolas iniciáticas ainda sobrevivem e em
determinados setores avançam como alternativa educacional da chamada Nova
Era, do III Milênio.
Características mais comuns da educação
iniciática:
• Ocultismo, misticismo, mistérios,
enigmatismo e simbolismo;
• Busca do conhecimento das
relações e inter-relações entre o Homem,
Divindades e a Natureza;
• Diferenciação entre o
conhecimento Exotérico e o conhecimento Esotérico;
• Relação de confiança entre mestre
e discípulo;
• Regras disciplinares e de conduta
(silêncio, jejum, meditação, olhar,
etc.);
• Progressão gradual dialética em
etapas (graus hierárquicos);
• Instrumentos rigorosos de
avaliação probatória;
• Diferenciação metodológica entre
a pedagogia e a andragogia.
Fazendo uma comparação teórica , enquanto a Pedagogia
está voltada para a educação existencial das crianças a Andragogia volta-se
para o aperfeiçoamento consciencial dos adultos. Para tanto, esta última lança
mão de métodos diferenciados da educação infantil, capazes de amadurecer o indivíduo
biologicamente já desenvolvido, porém emocionalmente imaturo, através do
processo de despertamento. Essa metodologia consiste basicamente na reversão do
conhecimento e do aprofundamento de experiências, do plano exotérico para a
dimensão esotérica. O conhecimento esotérico está inserido no rol dos principais tipos de
conhecimentos manifestados na experiência humana, a saber: o mágico, o
empírico, revelado, lógico-racional, o experimental, e o intuitivo. O
esoterismo enquadra-se, portanto, na esfera da revelação místico-religiosa, da
qual provém a maioria dos ensinamentos espiritualistas ministrados pelas
escolas iniciáticas tradicionais e também pelas principais religiões históricas
das civilizações.
Lembrando Platão e sua analogia sobre o efeito moral
do conhecimento nas pessoas, a Verdade é como uma luz que ofusca a visão do
expectador que se habituou com a escuridão de uma caverna escura. Ele
vai se adaptando gradualmente à medida que faz incursões de olhos vendados até
que possa finalmente encarar a luz sem nenhuma proteção. A venda nos olhos é o exoterismo;
tirar a venda dos olhos é processo de iniciação esotérica.
Todas as religiões e escolas filosóficas
espiritualistas, em todas as épocas, guardam duas formas básicas de expressão
social: uma esotérica, voltada para os setores mais intelectualizados, cuja
minoria tende sempre a formar suas elites, corporativas ou não; e outra
exotérica, voltada para as massas, para cuja maioria limitada intelectualmente
assume significados simbólicos e ritualísticos mais acessíveis ao seu nível de
compreensão. Isso significa que as religiões e filosofias possuem conhecimentos
complexos que precisam ser, de uma forma ou de outra, vulgarizados, quase
sempre em forma de dogmas e sacramentos cerimoniais.
Mas tudo isso só amplia ainda mais o fascínio que o
ser humano tem pelo conhecimento esotérico. Menos palpável e realista do que os
conhecimentos lógico-racional e empírico, ele não fornece provas
materiais dos fatos, porém gera em todos nós uma profunda confiança na imaginação
e na capacidade filosófica de cultivar as possibilidades do desconhecido. A
mente humana não se alimenta apenas de convicções lógico-racionais. Nossa
auto-realização depende do entendimento e da compreensão de muitas outras
coisas que estão fora dessa esfera limitada da cognição racional. Além do
pensamento estão inúmeras outras experiências ainda não decifradas e que se
escondem no universo dos nossos sentimentos e emoções. Somente quando
estivermos suficientemente equilibrados nas três áreas vivenciais é que
poderemos conviver com o conhecimento pleno e absoluto das coisas. Por enquanto
teremos que viver na relatividade. Enquanto isso, não há nada de mal especularmos
nesse terreno oculto e atraente do mundo das idéias, da esorealidade da qual
falava Platão.
Artigo Reproduzido com Autorização do
Autor
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