Para compreendermos as origens da Umbanda precisamos entender que o
mundo não se resume só nas atividades, nem na cultura que observamos à nossa
volta. Cada país, cada povo, possui seu atavismo cultural, sua bagagem
histórica.
Atavismo é o conjunto de valores morais, físicos e culturais que cada
nação possui e que foram herdados das gerações antecedentes. Essas experiências
são passadas de geração a geração, mantendo ao longo da história, uma gama de
características comportamentais que identificam os povos e as nações.
Carl Gustav Jung (Suíça, 1875-1961), eminente estudioso do psiquismo
humano, afirmou que o atavismo é provocado por um mecanismo que ele denominava
"inconsciente coletivo", cujos conteúdos são arquétipos, isto é,
representantes comuns dos instintos nas diferentes culturas. É nesse sistema
que os costumes, conhecimentos e valores dos antepassados se deslocam pelo
hábito e por uma espécie de espírito conservador para as gerações vindouras.
Chega-se a dizer popularmente que os jovens possuem no "sangue"
muitos valores e defeitos dos seus antepassados. Ora, nós espíritas sabemos que
a alma não herda caracteres morais ou intelectuais daqueles que se constituíram
em pais carnais do indivíduo. Portanto, o inconsciente coletivo é mesmo um
mecanismo de transferência de valores.
Para se entender a Umbanda é preciso primeiro compreender como foi
formada a sociedade brasileira e quais são suas raízes étnicas. Uma seita, culto
ou religião, instala-se num dado grupo social quando encontra elementos
culturais favoráveis à sua proliferação.
Quais são, pois, as características sócio-culturais da sociedade
brasileira?
Vejamos: Sabe-se que no Brasil existe uma mistura muito grande de
raças. Se, por um lado, esse fato deixou o brasileiro sem identidade definida,
por outro fez com que a nação se transformasse num verdadeiro berço, onde qualquer
Espírito encarnado encontra espaço para suas realizações. Daí a facilidade para
frutificar
idéias religiosas de diversificadas tendências.
Quem chega ao país, depois de certo tempo acaba sentindo-se em casa,
dada a diversidade de raças e costumes. No princípio, no entanto, não foi
assim. Ao desembarcar no continente no ano de 1500, os colonizadores
portugueses encontraram aqui uma significativa nação indígena. No passar do
tempo, esses povos foram dominados e subjugados pelos conquistadores europeus.
O reflexo desse domínio perdura até os dias de hoje na forma de perseguições,
abandono e preconceitos contra as tribos aborígenes. Pode-se, pois, afirmar que
a primeira raiz do povo brasileiro é o índio.
Habituados à vida na natureza, os silvícolas não se adaptaram ao que
os brancos queriam com sua diferente cultura e reagiam como podiam ao trabalho
escravo, imposto pelos novos donos da terra.
As "capitanias", imensas fazendas feudais, deveriam produzir
riquezas destinadas à Coroa Portuguesa.
Mas faltava mão de obra. Os índios não se mostravam dispostos a
servirem de força de trabalho. Onde se poderia arranjar trabalhadores capazes de
cumprir com as obrigações do campo?
Na Europa certamente não seria. Ninguém por lá estava disposto a
deixar as delícias da Corte para encarar o serviço braçal numa terra quente,
cheia de mosquitos, doenças e outras coisas mais, a não ser os degredados, e
obviamente porque lhes era imposto.
Tiveram então a ideia de buscar na África o elemento negro. Não tendo
razões lógicas para convencer esses irmãos a deixarem sua terra, empreenderam
verdadeiras caçadas, caracterizadas pela forma desumana com eram executadas.
Nascia o tráfico de escravos negros. E, eles foram trazidos para o país em grande quantidade. Muitos dos que embarcavam nos imundos
navios negreiros, nunca chegavam a desembarcar na terra tupiniquim, pois ao
serem tratados como animais, adoeciam e era atirados aos tubarões para que não
contaminassem o resto da "carga". O negro: eis a segunda raiz de nossa
gente!
Antes do aparecimento do povo brasileiro, cada uma dessas duas raças,
o índio e
o negro, já trazia particularmente sua história milenar e, com ela, um
patrimônio cultural e religioso. Ao misturarem-se, pela convivência, com a
cultura européia trazida pelos descobridores, pelos aventureiros e mais tarde pelos
imigrantes, deram origem ao conhecido "povo brasileiro".
A Umbanda foi fundada no Brasil por razões diversas. Uma delas é essa
bagagem religiosa atávica que nos liga ao passado do negro e do índio
(pretos-velhos e caboclos). Ela teve facilidade para crescer nesse sítio
espiritual. Outra razão, foi a de desenvolver junto ao povo, um trabalho mais
voltado para os interesses imediatistas, popularescos.
A Umbanda também nasceu em terras brasileiras para atuar na solução de
certos processos obsessivos, não alcançados pela prática espírita da época: a
magia negra.
José Queid Tufaile Huaixan
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