A Desfiguração do Cristo
José Herculano Pires
O interesse em desfigurar o Cristo vem dos planos inferiores do
mundo espiritual e se manifesta de várias formas: pelas comunicações mediúnicas
inferiores, pelas intuições dadas a adeptos do Cristianismo e do Espiritismo
para introduzirem teorias e práticas ridicularizantes no meio doutrinário,
sempre atribuindo a Jesus posições, palavras e atitudes que o coloquem em
situação crítica pelas pessoas de bom senso. Para isso, as entidades mistificadoras
se aproveitam da ignorância e da vaidade de criaturas autoritárias e arrogantes,
que facilmente se deixam levar por elogios e posições lisonjeiras que podem exaltá-las
na instituição a que pertencem.
A gigantesca luta empreendida pelo apóstolo Paulo, após a sua
conversão, para preservar a pureza dos ensinos de Jesus e da sua excelsa
figura, em meio aos próprios apóstolos do Mestre, revela de maneira eloqüente,
a dificuldade dos homens para compreenderem a Verdade Cristã.
Os gnósticos-docetas do primeiro século sustentavam que Jesus
não tinha realidade física, que o seu corpo era apenas aparente. Sua
posição contrariava as teses da encarnação do Cristo, apresentando-o como uma
espécie de Deus mitológico, sob a influência das idéias helenísticas. O
Docetismo exerceu grande influência em Alexandria, propagando-se a Éfeso, onde
o apóstolo João instalara a sua Escola Cristã. João refutou a tese doceta como
herética, pois além de não corresponder à realidade histórica, transformava o
Cristo num falsário.
A fábula dos docetas ( como o apóstolo Paulo a classificou)
apresentava-se como uma das mais estranhas desfigurações do Cristo, fornecendo
elementos ricos e valiosos aos mitólogos para negarem a existência real e
histórica de Jesus de Nazaré.
Essa teoria absurda reapareceu na França, através de uma obra
confusa e carregada de pesado misticismo ridicularizante. Um advogado de
Bordeaux, Jean Baptiste Roustaing, elaborou essa obra através de comunicações
mediúnicas atribuídas a Moisés, os Apóstolos e os Evangelistas. Um grupo
místico do Rio de janeiro adotou com entusiasmo essa obra, conseguindo
apossar-se da Federação Espírita Brasileira, e até hoje a propaga e sustenta,
contra a maioria das instituições espíritas do Brasil e do mundo. É
inacreditável o fanatismo dos roustainguistas, o que se justifica pela sua
mentalidade anti-racional, apegada aos resíduos do passado mágico e mitológico,
portanto contrária à posição racional, apegada aos resíduos do passado mágico e
mitológico, portanto contrária à posição racional do Cristianismo e do
Espiritismo. Esses defensores do absurdo chegam a citar a obra mistificadora Os
quatro evangelhos, como uma das dez mais importantes da literatura mundial, e
Roustaing, como uma das maiores figuras da Humanidade. Kardec condenou essa
obra, o que provocou um revide de Roustaing.
Hoje só existe um símbolo para o Cristo: o da Ressurreição.
Provada cientificamente a existência do corpo espiritual, provada a continuidade
da vida triunfante após a morte, provada a herança de Deus na imensidade do
Cosmos povoado de mundos, provada a ineficácia das instituições religiosas e
seus métodos para levar os homens a Deus, pois que a maioria se afastou de Deus
e o considera como superstição estúpida, só a figura do Cristo Ressuscitado,
triunfando sobre a veleidade do poderes terrenos e confirmando em si mesmo a
verdade dos seus ensinos, poderá libertar as consciências do apego às coisas perecíveis,
dando-lhes a confiança no poder superior do espírito. Se somos espíritos não apenas
um corpo material, e se temos a certeza de que o Cristo continua vivo e a nos inspirar
em nossas lutas no caminho do bem, por que cultivamos a morte e até mesmo as imagens
de um cadáver que não foi encontrado no túmulo?
A desfiguração do Cristo atingiu o máximo nessas imagens frias
que dormem o ano inteiro nas criptas das Igrejas, à espera do seu enterro
anual, com luto, choro e velas acesas. O sadismo humano se revela num
automatismo consciencial que o perpetua nas gerações sucessivas. Chegou o
momento de compreendermos que o Cristo está diante de nós, na plenitude de sua
vida e seu poder, procurando despertar-nos do pesadelo da morte.
*Livro: Revisão do Cristianismo –
José Herculano Pires – Editora Paidéia.*
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