"6 . – A felicidade está na razão direta do progresso realizado, de sorte que, de dois Espíritos, um pode não ser tão feliz quanto o outro, unicamente por não possuir o mesmo adiantamento intelectual e moral, sem que por isso precisem estar, cada qual, em lugar distinto. (...)
Sendo a felicidade dos Espíritos inerente às suas qualidades, haurem-na eles em toda parte em que se encontram, seja à superfície da Terra, no meio dos encarnados, ou no Espaço".
(O Céu e O Inferno, Cap. III - O CÉU. Grifos nossos)
A palavra céu está comumente associada em religião a algum lugar onde desfrutamos de "recompensas". Assim, pode parecer estranho não querer circunscrever um lugar para esse céu. Poderíamos indagar, então, qual o céu dos Espíritos? Acreditamos que sim. Não no sentido de ser possível localizá-lo numa região determinada. Mas como qualquer lugar em que algo especial possa ser sentido, algo como um estado de harmonia, de suficiência afetiva, o reino dos Céus, mencionado por Jesus.
Nessa ordem de idéias, o que realmente impressiona é encontrar nas palavras de Kardec acima, uma ligação entre duas idéias muito simples: progresso e felicidade. Simples dissemos nós, será? Talvez sim, mas a exigir uma certa aptidão para ver, os olhos de ver. Então, procuremos entender isso um pouco melhor. Mas, não esqueçamos leitor, duas (ou mais) cabeças pensando pode não levar a nada se os corações não estiverem dispostas a amar.
No mês anterior mencionamos um processo subentendido nas palavras de Kardec. Vale recordar:
• Conhecimento e experiência, levando ao desenvolvimento de novas faculdades, `a ampliação da percepção e, conseqüentemente, maior sensibilidade (novos gozos).
O que queríamos dizer com isso? Pode parecer de início que se trata de algum curso, com professores, matérias, etc. Assim, freqüentaríamos uma "escola" (para adquirir conhecimento), desenvolveríamos atividades (para ganharmos experiência) e, como resultado, teríamos adquirido mais habilidades. Habilidade para perceber, fazer, organizar, etc. Acabaríamos por nos tornarmos mais sensíveis, isto é, capazes de apreender nuances que antes sequer imaginávamos... Bem, isso, de certa forma, pode ser exemplificado quando educamos o nosso ouvido para a música. O que acontece? Começamos a distinguir aspectos que antes simplesmente não existiam para nós. Uma coisa é ser ouvinte de música, outra é se envolver com ela, exercitar-se nela, perceber-se por si mesmo nela, vivenciá-la. Então, algo acaba acontecendo. Poderíamos chamar de maturidade, habilidade, percepção, etc. Pouco importa o nome. O fato é que algo ocorreu conosco nesse processo. Mudamos. Veja, amigo leitor. Não mudamos algo. Nós mudamos.
E o que tudo isso tem a ver com o título da nossa discussão? Façamos a "ponte": Que espera, o leitor, da outra vida?
Examinemos melhor a questão do céu, então, com Kardec, complementando-a com a colocação acima. Ora, se alguma coisa esperamos da outra vida, nada obteremos porque não existe uma outra vida, existe uma só vida e inúmeras existências. Por outro lado, desejar apenas uma melhor existência na Terra ou alhures, pode significar simplesmente que ainda não amamos, nossos atos estariam vinculados a um secreto egoísmo, uma secreta intenção de barganha com a Divindade. Mais ou menos assim: Nós nos comportamos bem, espalhamos o bem a mãos-cheias, beneficiamos o próximo e Ele, uma divindade de fora, nos recompensaria, premiando-nos com uma mansão Celeste ou uma reencarnação venturosa, em que seremos ricos ou desfrutaremos de uma boa situação social. Será isso o reino dos céus?
É claro que a dedicação ao próximo nos trará benefícios. Mas é preciso cuidado, pois isso também pode demonstrar o apego a alguma coisa que imaginamos que deve existir. E, se não for bem como esperávamos? Talvez o melhor seja que não esperemos o nosso céu depois da morte, mas que comecemos a vivê-lo aqui e agora. E é justamente isso que a colocação de Kardec nos ajuda a entender.
"A felicidade está na razão direta do progresso realizado" ou que "(...) a felicidade dos Espíritos [é] inerente às suas qualidades"
Ainda em O Céu e o Inferno:
"O homem foi criado para a atividade; a atividade do Espírito é da sua própria essência; e a do corpo, uma necessidade."
O que podemos perceber então? Progresso exige atividade criadora. O Reino de Deus não é uma recompensa que nos será dada mais tarde, quando formos bonzinhos. Ele já se encontra dentro de cada um e, na medida em que criamos as condições necessárias à sua emersão, Ele virá para fora de nós, empolgando todo o nosso ser, e seremos seu instrumento e seu arauto no mundo.
É claro que para criar essas condições necessitamos de auxílio, orientação, cuidados. Afinal, como isso acontece? O que podemos fazer? Três idéia poderosas se somam às anteriores: atividade, qualidade e felicidade. Ou, juntando as três, assim resumir: Qual a força da nossa motivação? Afinal, como dizia Weber, filósofo, as idéias nada mais são que trilhos nos quais o interesse corre. Questões que procuraremos abordar no próximo "encontro", por enquanto ficando com o pensamento de Schiller:
"Para que a verdade triunfe na luta com a força, ela deve se transformar primeiro numa força e se ligar a algum impulso como seu advogado, no reino dos fenômenos, pois os impulsos são as únicas forças geradoras no mundo do sentimento".
E não foi isso o que Jesus fez? Deu força à Verdade pela ação do seu exemplo?
Vanderlei Luiz Daneluz Miranda
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