Ana Cecília
Rosa
Nos
evangelhos, estão relatadas diversas passagens, nas quais o arrependimento dos
erros cometidos é condição primária para o perdão das faltas e a felicidade
eterna. A visão de Deus como um juiz severo e vingativo é ainda temida por muitos,
motivando mudança de comportamento e o ensejo de penitenciar-se. O
arrependimento é o grito da consciência, nosso aguilhão íntimo, que reconhece a
transgressão de condutas morais e o desvio do dever, levando-nos a experimentar
a culpa e suas consequências. O Espiritismo esclarece-nos que somos apenas
Espíritos arrependidos, sensibilizados pelo remorso em busca do reajustamento
através da reparação.
Quando alguém se equivoca por algum motivo
e se arrepende, é compreensível que a culpa se instale nos painéis da
consciência. Segundo Joanna de Angelis, “a culpa surge como uma forma de
catarse necessária para a libertação dos conflitos” (Momento de Consciência,
cap. 6). Não sendo um sentimento negativo em si, cumpre seu papel de despertar-nos
para a atitude necessária de recompormo-nos moralmente. A experiência de
vivenciar a culpa sem nenhum propósito de transformação ou não reincidência no
erro consubstancia o remorso, gerando as atitudes infelizes de autopunição. Qualquer tentativa
de reter, na lembrança, os delitos passados ou oportunidades perdidas, lamentando-os,
não fará que o erro se apague. Ao contrário, proporciona graves distúrbios
psicológicos, conscientes ou não, principalmente se o indivíduo for incapaz de
praticar o recurso do autoperdão.
A
sustentação deste pensamento enfermiço não só traz a falsa idéia de que o
sofrimento vivido é, por si só, reparador da falta, como também impede que se
busquem as ações edificantes necessárias para a corrigenda, única forma de
libertação da culpa.
Tomar
consciência de seu erro e libertar-se da culpa não exime o indivíduo da
necessidade de reparar a falta, já que o ofendido, geralmente, não está isento
da dor causada pelo nosso ato infeliz. Segundo Allan Kardec “o arrependimento,
conquanto seja o primeiro passo para a regeneração, não basta por si só; são precisas
a expiação e a reparação” (Céu e Inferno, parte I, cap. 7).
É
relevante considerar que as noções de consciência e moral desenvolvem-se
lentamente, no decurso de diferentes encarnações, para o espírito imortal. É
precisamente no momento em que a responsabilidade se faz presente que se
estabelece o contraponto entre a “culpa saudável” e o remorso patológico.
Quando
convertemos a culpa em responsabilidade, crescemos psicologicamente e ficamos
mais predispostos à prática do perdão e, consequentemente, à reparação.
A responsabilidade marca, de fato, uma
diferença na conduta do ser. Ser responsável implica em ter consciência dos problemas
existenciais, reconhecer humildemente as falhas, demonstrar capacidade de agir
com elevação e dignidade e desejar sinceramente reparar o mal feito.
Se,
ao lidar com o sentimento de culpa, o indivíduo assumir a responsabilidade pelos
seus atos, pensamentos e sentimentos de forma madura, saberá enfrentar as consequências
de suas escolhas sem a perturbação do remorso patológico. Apagar as lembranças
infelizes de uma falta e suas consequências é trabalho de almas que já tomaram
conhecimento dos valores morais verdadeiros e praticam uma postura mais
realista e produtiva em relação à vida.
Segundo Emmanuel, “Cair em culpa demanda,
por isso mesmo, humildade viva para o reajustamento tão imediato quanto
possível de nosso equilíbrio vibratório, se não desejamos o ingresso
inquietante na escola das longas reparações” (Pensamento e vida, cap. 22).
O Espiritismo,
afirmando que a existência humana é oportunidade de crescimento e realizações
no bem, renova-nos a esperança para cumprir com os resgates necessários a fim
de que a nossa consciência tranquilize-se após a reparação.
Ana
Cecília Rosa é médica pediátrica, residente no Brasil. É membro do Instituto de
Divulgação Espírita - Araras/SP.
Jornal de Estudos Psicológicos
Ano II N° 8 Janeiro e
Fevereiro 2010
The Spiritist Psychological
Society
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