Livro:
Entre a Terra e o Céu
Capítulo
X _ Preciosa Conversação
Blandina, que parecia bastante versada nas
questões da infância, associando-se à conversação que Clarêncio desenvolvia,
considerou, com interesse:
- Efetivamente, a Lei é invariável, contudo, a
criança desencarnada muitas vezes é problema aflitivo. Quase sempre dispõe de
afeiçoados que a seguem, de perto, amparando-lhe o destino, entretanto tenho
observado milhares de meninos que, pela natureza das provações em que se envolveram,
sofrem muitíssimo, à espera de oportunidades favoráveis para a aquisição dos
valores de que necessitam.
E sorrindo, bondosa, acrescentou:
- O caso de Júlio não é para mim dos mais
dolorosos. Tenho visitado departamentos de reajuste em que demoram irmãos
nossos, arrancados à carne, violentamente, como frutos verdes da árvore em que
se desenvolvem... Processos de mente enfermiça que só abençoadas estações
regenerativas na carne conseguem curar...
(...)
(...) _ temos para demonstração mais prática
os absurdos da megalomania intelectual. Há pessoas, na Terra, que não se
acautelam contra os desvarios da inteligência e fazem da astúcia e da vaidade o
clima em que respiram. Insistem na inércia do coração, abominam o sentimento elevado
que interpretam por pieguismo e transformam a cabeça num laboratório de
perversão dos valores da vida. Não cuidam senão dos próprios interesses, não
amam senão a si mesmos. Não percebem, contudo, que se ressecam interiormente e
nem imaginam os resultados cruéis da celebração para o mal. Freqüentemente, na
luta mundana, avultam na condição de dominadores poderosos, com vastíssimo
potencial de influência sobre amigos e adversários, conhecidos e desconhecidos.
Mas, esse êxito é ilusório. Caem sob o guante da morte com grande alívio dos contemporâneos
e passam a receber-lhes as vibrações de repulsa.
Semelhantes criaturas naturalmente são vítimas
de si mesmas e sofrem os mais complicados desequilíbrios mentais. Depois de
períodos mais ou menos longos de purgação, após a transição da morte, voltam à
carne, necessitados de silêncio e solidão para se desvencilharem dos
envoltórios inferiores em que se enredaram, assim como a semente precisa do
isolamento em cova escura para desintegrar os elementos pesados que a
constringem, para novo desabrochar.
(...)
- Imaginemos que a terra se recusasse a
auxiliar as sementes que esperam reviver. O solo expulsá-las-ia, e, em vez dos
germens libertados para a vitória da plantação, teríamos tão somente pevides
secas, em aflitiva inquietude, desorientando a lavoura. Em verdade, a maioria
das mães é constituída por sublime falange de almas nas mais belas experiências
de amor e sacrifício, carinho e renúncia, dispostas a sofrer e a morrer pelo
bem-estar dos rebentos que a Providência Divina lhes confiou às mãos ternas e
devotadas, contudo há mulheres cujo coração ainda se encontra em plena sombra.
Mais fêmeas que mães, jazem obcecadas pela idéia do prazer e da posse e,
despreocupando-se dos filhinhos, lhes favorecem a morte. O infanticídio
inconsciente e indireto é largamente praticado no mundo. E como o débito
reclama resgate, as delongas na solução dos compromissos assumidos acarretam enormes padecimentos nas criaturas que se
submetem aos choques biológicos da reencarnação e vêem prejudicadas as suas
esperanças de quitação com a Lei.
Ante a pausa que se fizera natural, inquiri:
- Mas a Lei não traçará princípios inamovíveis?
Pretenderá a irmã dizer que uma criança pode desencarnar, fora do dia indicado
para sua libertação?
- Sim, sem dúvida _ atalhou o Ministro, que nos
escutava -, há um programa estruturado na Espiritualidade para as nossas
tarefas humanas, entretanto, pertence-nos a condução dos próprios impulsos
dentro delas.
Em regra geral, multidões de criaturas cedo se
afastam do veículo carnal, atendendo a serviços de socorro e sublimação, mas,
em numerosas circunstâncias, a negligência e a irreflexão dos pais são
responsáveis pelo fracasso dos filhinhos.
- Aqui _ explicou Blandina, delicada _
recebemos muitas solicitações de assistência, a benefício de pequeninos
ameaçados de frustração. Temos irmãs que por nutrirem pensamentos infelizes
envenenam o leite materno, comprometendo a estabilidade orgânica dos
recém-natos; vemos casais que, através de rixas incessantes, projetam raios
magnéticos de natureza mortal sobre os filhinhos tenros, arruinando-lhes a
saúde, e encontramos mulheres invigilantes que confiam o lar a pessoas ainda
animalizadas, que, à cata de satisfações doentias, não se envergonham de
ministrar hipnóticos a entezinhos frágeis, que reclamam desvelado carinho... Em
algumas ocasiões, conseguimos restabelecer a harmonia, com a recuperação
desejável, no entanto, muitas vezes somos
constrangidas a assistir no malogro de nossos
melhores propósitos.
- Nesses casos... _ interferi, buscando
maiores esclarecimentos.
(...)
- Nesses casos, ainda e sempre, a Lei é
invariável. As provas e tarefas sofrem dilação no tempo, mas serão cumpridas,
afinal. Aquilo que não se realiza num século, pode efetuar-se em outro. Nossa
boa vontade e nossa aplicação aos Desígnios Divinos podem abreviar qualquer
espécie de serviço. Quem persiste na direção do bem, mais cedo atinge a
vitória.
(...)
- Não vale fugir às responsabilidades, porque
o tempo é inflexível e porque o trabalho que nos compete não será transferido a
ninguém.
Hilário, que acompanhava a conversação com
extremo interesse, considerou:
- Antigamente, na Terra, conforme a teologia
clássica, supúnhamos que os inocentes, depois da morte, permaneciam recolhidos
ao descanso do limbo, sem a glória do Céu e sem o tormento do inferno, e, nos
últimos tempos, com as novas concepções do Espiritualismo, acreditávamos que o
menino desencarnado retomasse, de imediato, a sua personalidade de adulto...
- Em muitas situações, é o que acontece _
esclareceu Blandina, afetuosa -; quando o Espírito já alcançou elevada classe
evolutiva, assumindo o comando mental de si mesmo, adquire o poder de
facilmente desprender-se das imposições da forma, superando as dificuldades da
desencarnação prematura. Conhecemos grandes almas que renasceram na Terra por
brevíssimo prazo, simplesmente com o objetivo de acordar corações queridos para
a aquisição de valores morais, recobrando, logo após o serviço levado a efeito,
a respectiva apresentação que lhes era costumeira. Contudo, para a grande
maioria das crianças que desencarnam, o caminho não é o mesmo. Almas ainda
encarregadas no automatismo inconsciente, acham-se relativamente longe do
autogoverno.
Jazem conduzidas pela Natureza, à maneira das
criancinhas no colo maternal. Não sabem desatar os laços que as aprisionam aos
rígidos princípios que orientam o mundo das formas e, por isso, exigem tempo
para se renovarem no justo desenvolvimento. É por esse motivo que não podemos
prescindir dos períodos de recuperação para quem se afasta do veículo físico,
na fase infantil, de vez que, depois do conflito biológico da reencarnação ou
da desencarnação, para quantos se acham nos primeiros degraus da conquista de
poder mental, o tempo deve funcionar como elemento indispensável de
restauração. E a variação
desse tempo dependerá da aplicação pessoal do
aprendiz à aquisição de luz interior, através do próprio aperfeiçoamento moral.
Encantava-nos a exposição clara e simples de
nossa interlocutora, cuja palavra tangia com tanta felicidade graves problemas
da vida.
Em suas formas verbais singelas e acessíveis,
penetrávamos inquietantes enigmas da puericultura.
Blandina sabia associar a compreensão e a
graça, instruindo-nos com discernimento.
Comovido, diante das anotações que lhe
definiam a valiosa posição cultural, ponderei:
- Usando semelhantes apontamentos, podemos
entender, com mais segurança, os processos dolorosos das enfermidades
congênitas e das moléstias insidiosas que assaltam a meninice no mundo. Sempre
fui possuído de aflitivo assombro, à frente do mongolismo e da epilepsia, da
encefalite letárgica e da meningite, da lepra e do câncer, na tenra organização
infantil...
- E que dizer dos desastres irremediáveis _
considerou Hilário, com emoção -, dos desastres que arrebatam adoráveis flores
do lar, deixando inconsoláveis pais e mães? Por vezes numerosas, procurei
resposta às terríveis inquirições que nos atormentam, perante corpinhos
dilacerados, nos hospitais de sangue, sem conseguir ausentar-me do escuro
labirinto.
- Sim _ esclareceu a enfermeira, bondosa -, as
reparações nos martirizam na carne, mas, sem elas, não atingiríamos o próprio
reajustamento.
- Cada qual de nós renasce na Terra _ apreciou
o Ministro _ a exprimir na matéria densa o patrimônio de bens ou males que
incorporamos aos tecidos sutis da alma. A patogenia, na essência, envolve
estudos que remontam ao corpo espiritual, para que não seja um quadro de
conclusões falhas ou de todo irreais. Voltando à Terra, atraídos os
acontecimentos agradáveis ou desagradáveis, segundo os títulos de trabalho que
já conquistamos ou conforme as nossas necessidades de redenção.
Bem humorado, acrescentou:
A carne, de certo modo, em muitas
circunstâncias não é apenas um vaso divino para o crescimento de nossas
potencialidades, mas também uma espécie de carvão milagroso, absorvendo-nos os
tóxicos e resíduos de sombra que trazemos ao corpo substancial.
Reparei, então, com mais insistência, a figura
suave de Blandina.
Porque se dedicara ela, assim, a trabalhos tão
complexos? Não seria mais justo ouvir aquela conversação dos lábios da
simpática Mariana, que ali se achava, junto de nós, em sua posição de matrona
respeitável? Externei os meus pensamentos, perguntando, com discrição, à jovem
o porquê da grave tarefa de que se incumbia.
Blandina apagou a luz do sorriso que lhe
adornava o semblante, como flor aberta que se fechasse, de súbito.
Pesado silêncio pairou no recinto.
Mas, generosa e simples, adoçou a expressão
fisionômica e falou, quase conselheiral:
- Fui casada em minha última existência e
somente há três anos terrestres me vejo, de novo, na vida espiritual. Não pude
acariciar um filhinho, em meus sonhos recentes de mulher, mas hoje sei que
preciso reeducar-me no amor de mãe, consoante os débitos que contraí no
passado. Realmente, sinto grande afeição pelas crianças, contudo, tenho
igualmente enormes dívidas morais para com elas...
O assunto descambava para um círculo
particular, que devia ser sagrado aos nossos olhos.
Por isso mesmo, Clarêncio fez mudo sinal para
mim e a conversação foi canalizada para outro rumo.
Questões
para estudo:
1) Neste capítulo, verificamos a importância
do comportamento cristão dos pais no que se refere ao tratamento, zelo e
dedicação aos seus filhos (decisivos para a sobrevivência dos pequenos).
Comente:
2) Uma criança pode desencarnar fora do dia
indicado para sua libertação. Como isso é possível? Quais as consequencias para
os pais?
3) Comente as seguintes frases:
a) _O
infanticídio inconsciente e indireto é largamente praticado no mundo. E como o
débito reclama resgate, as delongas na solução dos compromissos assumidos
acarretam enormes padecimentos nas criaturas que se submetem aos choques
biológicos da reencarnação e vêem prejudicadas as suas esperanças de quitação
com a Lei._
b) _A carne,
de certo modo, em muitas circunstâncias não é apenas um vaso divino para o
crescimento de nossas potencialidades, mas também uma espécie de carvão
milagroso, absorvendo-nos os tóxicos e resíduos de sombra que trazemos ao corpo
substancial._
4) Qual a diferença do desencarne de uma
criança com espírito já evoluído, daquela relativamente longe de seu
autogoverno?
Que Jesus, nosso mestre ilumine a todos em
nossos estudos!
(Alexandre
Paoli – colaborador de estudos Nosso Lar CVDEE)
C O
N C L
U S Ã O
Prosseguindo
a visita ao "Lar da Bênção", instituição que se dedica ao amparo e tratamento de
espíritos que desencarnam quando
o corpo físico ainda se encontra na condição de criança, André Luiz e a equipe
de benfeitores dirigida por Clarêncio travam interessante conversa com
Blandina, a benfeitora responsável pelos serviços. O tema da conversa versou
sobre a desencarnação de crianças, dando oportunidade a que o Autor nos
transmita os valiosos ensinamentos que recebeu a respeito do assunto.
QUESTÕES
PROPOSTAS PARA ESTUDO
1) Neste capítulo, verificamos a importância
do comportamento cristão dos pais no que se refere ao tratamento, zelo e dedicação aos seus filhos
(decisivos para a sobrevivência dos pequenos). Comente.
No livro
"Conduta Espírita", no capítulo referente à criança, André Luiz traça
algumas normas que devemos adotar na educação dos nossos filhos. Recomenda o
Autor, dentre outras coisas:
"Na meninice
corpórea, o Espírito encontra ensejo de renovar as bases da própria vida. Os
pais espíritas podem e devem matricular os filhos nas escolas de moral espírita
cristã, para que os companheiros recém-encarnados possam iniciar com segurança
a nova
experiência terrena.
Distribuir incessantemente
as obras infantis da literatura espírita, de autores encarnados e desencarnados,
colaborando de modo efetivo na implantação essencial da Verdade Eterna. O livro edificante vacina a mente infantil
contra o mal.
A noção de
responsabilidade nos deveres mínimos é o ponto de partida para o cumprimento
das grandes obrigações. Não permitir que as crianças participem de reuniões ou festas
que lhes conspurquem os
sentimentos, e, em nenhuma oportunidade, oferecer-lhes presentes suscetíveis de
incentivar-lhes qualquer atitude agressiva ou belicosa, tanto em brinquedos
quanto em publicações.
A criança sofre de
maneira profunda a influência do meio."
2) Uma
criança pode desencarnar fora do dia indicado para sua libertação. Como isso é
possível? Quais conseqüências para os pais?
Conforme
explicou Clarêncio, embora haja uma programação traçada na espiritualidade
antes da reencarnação, muitos espíritos deixam o veículo físico antes do tempo
previsto, em idade ainda infantil, em conseqüência da negligência e da irresponsabilidade
dos pais. O relacionamento conflituoso dos pais, o cultivo de pensamentos
contrários à Lei Natural, a invigilância e o tratamento hostil dedicado aos
filhos são circunstâncias que provocam nos menores uma impregnação de fluidos
deletérios que somatizam em seus corpos físicos, causando-lhes danos à saúde.
3)
Comente as seguintes frases:
a)
"O infanticídio inconsciente e indireto é largamente praticado no mundo.
E como o
débito reclama resgate,
as delongas na solução dos compromissos assumidos acarretam enormes
padecimentos nas criaturas que se submetem aos choques biológicos da
reencarnação e vêem prejudicadas as suas esperanças de quitação com a
Lei."
A
desencarnação prematura do menor, quando não se dá em obediência a um programa
previamente elaborado, quando ocorre na hipótese acima descrita, frustra o
espírito que está retornando para satisfazer resgate de débito contraído em passagem
pretérita. Esse débito, no entanto, não se apaga. Permanece pendente de acerto
de conta e, inevitavelmente, deverá ser saldado em futura reencarnação. A
demora em obter a quitação para com a Lei causa ao espírito
enormes padecimentos, pois prolonga o sofrimento por que passam todos os
endividados, ficando estagnada sua evolução.
b)
"A carne, de certo modo, em muitas circunstâncias não é apenas um vaso
divino para o
crescimento de nossas potencialidades, mas também uma
espécie de carvão milagroso, absorvendo-nos os tóxicos e resíduos de sombra que
trazemos ao corpo substancial."
O corpo
físico que recebemos graças à misericórdia de Deus não
serve apenas para o espírito
desenvolver suas potencialidades,
evoluindo em direção ao progresso. Funciona, também, como que uma espécie de
esponja, que absorve as lesões perispirituais causadas pelo descumprimento da
Lei no passado. Purgando essas feridas de seu perispírito, o espírito se livra
de suas conseqüências danosas, ficando liberado para, em encarnação vindoura,
plasmar um corpo físico sadio, que lhe servirá de instrumento para desenvolver
as potencialidades que o levarão à evolução.
4) Qual
a diferença do desencarne de uma criança
com espírito já evoluído, daquela relativamente longe de
seu auto--governo?
Quando o
espírito já alcançou alguma elevação, exercendo pleno domínio de sua mente,
consegue, mais rapidamente, libertar-se das impressões físicas da última
existência terrena. Nesse caso, superando sem maiores dificuldades o trauma que
a desencarnação prematura pode ocasionar, pela força do seu pensamento recobra
a forma com que se apresentava anteriormente à reencarnação. Segundo a
benfeitora Blandina, todavia, essa não é a situação na maioria dos casos. A
grande maioria das crianças que desencarnam ainda se encontram sujeitas ao
automatismo inconsciente, sem condições de se autogovernar. Com seu psiquismo
preso aos acontecimentos do passado, não possuem força mental para, de pronto, retomarem
a forma anterior. Permanecem, no plano espiritual, psiquicamente infantis, requerendo
tratamento restaurador para se recuperarem, através de seu aperfeiçoamento
moral, do choque biológico da reencarnação e da desencarnação, dois momentos
que, como sabemos, causam perturbação para o espírito.
Muita
paz a todos.
Sala
Nosso Lar
CVDEE
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