Capítulo 27 - Aflição e Tranquilidade
"Bem-aventurados os que
choram..." Jesus (Mateus, 5:4)
Conta-se no livro A Boa Nova na
lição O Sermão do Monte, que André e Levi escutavam de olhos úmidos os
conceitos do Senhor, cheios de sublimada emoção. Nesse interim, chegaram Tiago,
João e Pedro e todo o grupo se dirigiu, alegre, para um dos montes próximos.
O crepúsculo descia num deslumbramento
de ouro e brisas cariciosas. Ao longo de toda a encosta, acotovelava-se a turba
imensa. Muitas centenas de criaturas se aglomeravam ali, a fim de ouvirem a
palavra do Senhor, dentro da paisagem que se aureolava dos brilhos singulares
de todo o horizonte pincelado de luz. Eram velhinhos trêmulos, lavradores
simples e generosos, mulheres do povo agarradas aos filhinhos. Entre os mais
fortes e sadios, viam-se cegos e crianças doentes, homens maltrapilhos,
exibindo as verminas que lhes corroíam as mãos e os pés. Todos se comprimiam
ofegantes. Ante os seus olhares felizes, a figura do Mestre surgiu na eminência
enfeitada de verdura, onde perpassavam brandamente os ventos amigos da tarde.
Deixando perceber que se dirigia aos vencidos e sofredores do mundo inteiro e
como que esclarecendo o espírito de Levi, que representava a aristocracia
intelectual entre os seus discípulos, na sua qualidade de cobrador dos tributos
populares, Jesus, pela primeira vez, pregou as bem-aventuranças celestiais. Sua
voz caía como bálsamo eterno, sobre os corações desditores.
Bem-aventurados os pobres e os
aflitos!
Bem-aventurados os sedentos de
justiça e misericórdia!...
Bem-aventurados os pacíficos e os
simples de coração!...
Bem-aventurados os que choram,
porque eles serão consolados...
Por muito tempo falou do Reino de
Deus, onde o amor edificaria maravilhas perenes e sublimadas.
Jesus ali nos apresentou o
roteiro de libertação diante das aflições do nosso cotidiano.
Emmanuel, na lição, nos apresenta
roteiro atual através da Doutrina Espírita:
"Bem-aventurados os que
choram" - disse-nos o Senhor -, contudo, é importante lembrar que, se
existe aflição gerando tranquilidade, há muita tranquilidade gerando aflição.
No limiar do berço pede a alma
dificuldade e chagas, amargores e cicatrizes, entretanto, recapitulando de novo
as próprias experiências no plano físico, torna a concha obscura do egoísmo e
da vaidade, enquistando-se na mentira e na delinquência.
Aprendiz recusando a lição ou
doente abominando o remédio, em quase todas as circunstâncias, o homem persegue
a fuga que lhe adiará indefinidamente as realizações planejadas.
É por isso que na escola da luta
vulgar vemos tantas criaturas em trincheiras de ouro, cavando abismos de
insânia e flagelação, nos quais se despenham, além do campo material, e tantas
inteligências primorosas engodadas na auréola fugaz do poder humano, erguendo
para si próprios masmorras de pranto e envelhecimento, que as esperam,
inflexíveis, transposto o limite traçado na morte.
E é ainda por essa razão que
vemos tantos lares, fugindo à benção do trabalho e do sacrifício, à feição de
oásis sedutores de imaginária alegria para se converterem amanhã em cubículos
de desespero e desilusão, aprisionando os descuidados. Companheiros que os
povoam em teias de loucura e desequilíbrio, na vida espiritual.
No Evangelho Segundo o
Espiritismo vamos encontrar na lição Causas Atuais das Aflições, cap. V, item
4:
De duas espécies são as
vicissitudes da vida, ou se o preferirem, promanam de duas fontes bem
diferentes, que importa distinguir. Umas têm sua causa na vida presente;
outras, fora desta vida.
Quantos homens caem por sua
própria culpa! Quantos são vítimas de sua imprevidência, de seu orgulho e de
sua ambição!
Quantos se arruínam por falta de
ordem, de perseverança, pelo mau proceder, ou por não terem sabido limitar seus
desejos!
Quantas uniões desgraçadas,
porque resultaram de um cálculo de interesse ou de vaidade e nas quais o
coração não tomou parte alguma!
Quantas dissensões e funestas
disputas se teriam evitado com um pouco de moderação e menos suscetibilidade!
Quantas doenças e enfermidades
decorrem da intemperança e dos excessos de todo gênero!
Emmanuel termina a lição nos
dizendo:
Valoriza a aflição de hoje,
aprendendo com ela a crescer para o bem, que nos burila para a união com Deus,
porque o Mestre que te propões a escutar e seguir, ao invés de facilidades no
imediatismo da Terra, preferiu, para ensinar-nos a verdadeira ascensão, a
humildade da manjedoura, o imposto constante do serviço aos necessitados, a
incompreensão dos contemporâneos, a indiferença dos corações mais queridos e o
supremo testemunho do amor em plena cruz da morte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário