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terça-feira, 6 de janeiro de 2015

ENTREVISTA COM JUDAS ISCARIOTES, PELO ESPÍRITO HUMBERTO DE CAMPOS

O Escritor Humberto de Campos, desencarnado, enviava mensagens ao Chico de tudo o que ele vinha observando do outro lado. Certo dia visitando Jerusalém foi apresentado a Judas Iscariotes. Judas costumava visitar aquela região na época de Paixão de Cristo, para recordar.
Diz, Humberto de Campos, eu não estava ainda livre da curiosidade do repórter. E procurei ouvi-lo.
— O senhor é, de fato, o ex-filho de Iscariotes? – perguntei.
— Sim, sou Judas – respondeu aquele homem triste, enxugando uma lágrima nas dobras de sua longa túnica. Como o Jeremias, das Lamentações, contemplo às vezes esta Jerusalém arruinada, meditando no juízo dos homens transitórios...
— É uma verdade tudo quanto reza o Novo Testamento com respei­to à sua personalidade na tragédia da condenação de Jesus?
— Em parte... Os escribas que redigiram os evangelhos não aten­deram às circunstâncias e às tricas políticas que acima dos meus atos predominaram na nefanda crucifi­cação. Pôncio Pilatos e o tetrarca da Galileia, além dos seus interesses individuais na questão, tinham ainda a seu cargo salvaguardar os interes­ses do Estado romano, empenhado em satisfazer as aspirações religiosas dos anciãos judeus. Sempre a mes­ma história. O Sanedrim desejava o reino do céu pelejando por Jeová, a ferro e fogo; Roma queria o reino da Terra. Jesus estava entre essas forças antagônicas com a sua pureza imaculada. Ora, eu era um dos apai­xonados pelas ideias socialistas do Mestre, porém o meu excessivo zelo pela doutrina me fez sacrificar o seu fundador. Acima dos corações, eu via a política, única arma com a qual podia triunfar e Jesus não obteria nenhuma vitória. Com as suas teorias nunca poderia conquistar as rédeas do poder já que, no seu manto de po­bre, se sentia possuído de um santo horror à propriedade. Planejei então uma revolta surda como se projeta hoje em dia na Terra a queda de um chefe de Estado. O Mestre passaria a um plano secundário e eu arranjaria colaboradores para uma obra vasta e enérgica como a que fez mais tarde Constantino Primeiro, o Grande, depois de vencer Maxêncio às portas de Roma, o que, aliás, apenas ser­viu para desvirtuar o Cristianismo. Entregando, pois o Mestre, a Caifás, não julguei que as coisas atingissem um fim tão lamentável e, ralado de remorsos, presumi que o suicídio era a única maneira de me redimir aos seus olhos.
— E chegou a salvar-se pelo arrependimento?
— Não. Não consegui. O re­morso é uma força preliminar para os trabalhos reparadores. Depois da minha morte trágica submergi-me em séculos de sofrimento expiatório da minha falta. Sofri horrores nas perseguições infligidas em Roma aos adeptos da doutrina de Jesus e as minhas provas culminaram em uma fogueira inquisitorial, onde, imi­tando o Mestre, fui traído, vendido e usurpado. Vítima da felonia e da traição deixei na Terra os derradeiros resquícios do meu crime, na Europa do século XV. Desde esse dia, em que me entreguei pelo amor do Cris­to a todos os tormentos e infâmias que me aviltavam, com resignação e piedade pelos meus verdugos, fechei o ciclo das minhas dolorosas reencarnações na Terra, sentindo na fonte o ósculo de perdão da minha própria consciência...
E está hoje meditando nos dias que se foram... – pensei com tristeza.
— Sim... estou recapitulando os fatos como se passaram. E agora, irmanado com Ele, que se acha no seu luminoso Reino das Alturas que ainda não é deste mundo, sinto nestas estradas o sinal de seus di­vinos passos. Vejo-O ainda na cruz entregando a Deus o seu destino... Sinto a clamorosa injustiça dos companheiros que O abandonaram inteiramente e me vem uma recorda­ção carinhosa das poucas mulheres que O ampararam no doloroso transe... Em todas as homenagens a Ele prestadas, eu sou sempre a figura repugnante do traidor... Olho complacentemente os que me acu­sam sem refletir se podem atirar a primeira pedra... Sobre o meu nome pesa a maldição milenária, como sobre estes sítios cheios de miséria e de infortúnio. Pessoalmente, porém, estou saciado de justiça, porque já fui absolvido pela minha consciência no tribunal dos suplícios redentores. Quanto ao Divino Mestre – con­tinuou Judas com os seus prantos – infinita é a sua misericórdia e não só para comigo, porque se recebi trinta moedas, vendendo-O aos seus algozes, há muitos séculos Ele está sendo criminosamente vendido no mundo a grosso e a retalho, por todos os preços, em todos os padrões do ouro amoedado...

Humberto de Campos (Recebida em Pedro Leopoldo a 19 de abril de 1935, por Chico Xavier)

tri·ca
substantivo feminino
1. Chicana, trapaça, forense, enredo, maranha.
2. Nica, futilidade.

O ARAUTO
ANO XIV – Nº 82 – JANEIRO/FEVEREIRO – 2011
PUBLICAÇÃO BIMESTRAL
ÓRGÃO OFICIAL DA USE – INTERMUNICIPAL DE PIRACICABA
Sede e correspondência:
Rua 15 de Novembro, 944 14º andar – sala 143

13400‑370 – Piracicaba ‑ SP 

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