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sábado, 25 de julho de 2015

ESTUDANDO O CRISTIANISMO 14

16 - A TORA: A BASE DA INSTRUÇÃO JUDAICA

São também relevantes para nosso estudo, relatos sobre a instrução dos judeus na época de Jesus. 
Acreditamos que estas informações muito nos ajudarão na pesquisa que ora empreenderemos, na tentativa de conhecermos ou até inferirmos sobre este período que ficou desconhecido da vida de Jesus, de 1 a 30 anos, a não ser a sua apresentação ao Templo de Jerusalém (Lc. 2 41 a 52) quando Ele reaparece em cena, junto aos doutores da Lei. Para isso, tomamos com base o estudo do Professor de exegese antigotestamentária na Faculdade Teológica dos Carmelitas de Roma e Professor de língua hebraica no Pontifício Instituto bíblico de Roma Fabrizio Foresti. Vejamos o que ele diz.

A Tora, ou lei Divina escrita (correspondente aos primeiros cinco livros da Bíblia, chamados Pentateuco, e que são: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio), constitui o valor central do judaísmo, como este se reorganizou após o trauma do exílio na Babilônia (587-538 a.C.).

Segundo o relato bíblico e a tradição sucessiva, os cinco livros da Tora foram entregues por Deus a Moisés, no monte Sinai, ainda antes de o povo entrar na terra prometida. Mas logo Israel esqueceu-se ou descuidou-se das instruções Divinas (esta é a melhor tradução para a palavra hebraica Torah) e por fim, Deus acabou abandonando-o na mão dos inimigos. Depois do exílio, o escriba Esdras conseguiu reorganizar o povo, já de volta à antiga terra dos pais, sobre o fundamento teocrático da Lei dada a Moisés. A Tora tornou-se, assim, o eixo central da vida religiosa, civil e cultural do povo.

A instrução sistemática e gradual teve importantíssima tarefa de imprimir esse valor absoluto na alma de cada judeu. Todo o ciclo instrutivo, quando se organizou segundo um plano fixado, estava centrado nesse único tema: a Tora em sua literalidade antes de tudo, depois as tradições orais que interpretavam ou completavam a Tora escrita, e por fim alguns livros bíblicos, considerados mais como moldura decorativa da Tora do que como escritos de valor autônomo.

16.1 - A DIMENSÃO ESSENCIAL DO HOMEM JUDAICO

É principalmente no estudo da Lei que o homem judaico se realiza como pessoa. Tal estudo é, em primeiro lugar, a execução de uma ordem (conforme o trecho do Shemá, correspondente ao Deuteronômio 6,6-7). 
Enquanto prescrito por Deus, o estudo da Tora constitui um fim em si mesmo, e é já em si um ato de culto, que coloca o crente em comunicação com Deus. Além de culto, o estudo da Tora é cultura e trabalho. Enquanto culto, é a forma basilar da experiência judaica de Deus; enquanto cultura, fornece o objeto amplo  e, ao mesmo tempo, único  dos conhecimentos da pessoa; enquanto trabalho, é a principal atividade em que o israelita deve empregar seu esforço e consumir sua energia.

O judeu praticamente realizava de vários modos essa forma essencial de sua existência: como criança, mediante um amplo ciclo de formação escolástica; como adulto, mediante o culto na sinagoga ou em encontros de grupo.

16.2 - A INSTITUIÇÃO DE ESCOLAS ELEMENTARES

O dever de instruir os meninos na Tora cabia, antes de mais nada, ao pai de família. Contudo, as comunidades judaicas logo perceberam a necessidade de dar aos garotos uma educação sistemática e em tempo integral, e não largada ao acaso das diversas situações familiares.

Segundo uma passagem do Talmud-Yerushalmi (Ketubot 32c), foi Simeão bem Seta, chefe do sinédrio nos anos 103-76 a. C., quem ordenou: Que os meninos freqüentem a escola (bêt hassefer, literalmente casa do livro, ou seja, da Bíblia). Já o Talmud Babli (Baba batra 21 a) conservou uma tradição mais particularizada e um pouco diferente: num primeiro momento, a escola para meninos foi instituída em Jerusalém; depois, estendeu-se aos centros das prefeituras, sendo reservada, porém, somente aos rapazes de dezesseis ou dezessete anos; por fim, Josué ben Gamla ordenou que em cada distrito e em todo o vilarejo houvesse professores para meninos e que estes últimos começassem a freqüentar a escola a partir dos seis anos de idade.

Que relação existe entre essas duas tradições? É difícil decidir, principalmente porque não é certa a identificação de Josué ben Gamla. Não obstante, tendo todas as informações em nosso poder, parece certo que a instituição das escolas elementares na área judaica remonta ao século 1 a. C.

16.3 - O CURRÍCULO DA INSTRUÇÃO DE BASE

A formação escolar básica articulava-se em dois ciclos: um qüinqüênio de estudo da Tora e dos outros livros bíblicos, e, depois, por um biênio, em que o menino passava ao estudo das tradições orais complementares da Lei Michna. O primeiro período escolar iniciava-se depois que o menino havia completado cinco ou seis anos, prolonga-se por cinco anos e era sucedido pelo biênio do segundo ciclo. Quando o garoto fazia doze ou treze anos, voltava definitivamente para o convívio da família, e seu pai era obrigado a iniciá-lo numa profissão.

Em geral, a escola era ligada à sinagoga. Ali os meninos reuniam-se bem cedo e ocupavam-se de suas lições até a hora sexta, isto é, até o meio dia, e depois voltavam para suas casas. Somente os alunos do biênio médio-superior retornavam à escola mais à tarde. Os estudantes, naturalmente, eram todos meninos, porque dizia-se não há sabedoria para uma mulher a não ser o fuso (Talmud Yerushalmi, sota 19 a).

O calendário não previa férias; apenas no período mais quente, em julho e agosto, as aulas encerravam-se às dez horas, ao invés de ao meio-dia; os sábados eram dedicados à repetição da matéria aprendida, e não a lições novas. Assim que era recebido na casa do Livro, o menino aprendia as letras do alfabeto hebraico no próprio rolo da Tora e começava sua primeira leitura nos oito capítulos iniciais do Levítico. Depois desta etapa, em que aprendia a ler, passava a classe dos garotos mais velhos e prosseguia com eles no estudo de livro bíblico.

O método didático empregado pelo professor era muito simples: consistia, inicialmente, em mostrar aos alunos um verso do rolo, que mantinha aberto diante deles. Como a escrita hebraica reproduz somente as consoantes, e não as vogais, era indispensável que o professor lesse primeiro o verso, escandindo claramente cada sílaba, de modo que os estudantes, após tê-lo ouvido, pudessem repeti-lo corretamente.

E assim, de verso em verso, lido primeiramente pelo professor e muitas vezes repetido a altas vozes pelos meninos, ao fim de cinco anos a Bíblia hebraica estava praticamente decorada.

O segundo ciclo de estudos era dedicado à Lei oral, a Michna; sempre trabalhando com a memória, ajudada pela repetição ritmada, o aluno aprendia aquele complexo de tradições explicadas pelos doutores da Lei, tendo por objetivo interpretar e integrar a Tora escrita. O método empregado era o mesmo do primeiro ciclo, e esse método de repetição  em hebraico mishna  deu nome a todas essas tradições orais que posteriormente seriam recolhidas (por volta de 200 d.C.) no livro da Michna.

16.4 - A FORMAÇÃO SUPERIOR

Ao terminar o período escolar, o menino não abandonava sua formação. Freqüentando a sinagoga todos os sábados, podia relembrar e ampliar seus conhecimentos religiosos.

Os jovens aspirantes a escribas  isto é, profissionais da interpretação da Tora, juízes e mestres e chefes de sinagoga  deviam prosseguir sistematicamente, em nível superior, seus estudos da Lei oral. Freqüentavam escolas especiais, chamadas bet midrash, ou casa do estudo, que geralmente eram chefiadas por um mestre renomado.

Escolas desse tipo estavam disseminadas pelos mais importantes centros do país. Particularmente célebre era a escola fundada pelos famosos mestres Hillel e Shammai no próprio recinto do templo de Jerusalém e em estreita legação com o Sinédrio. (verifique a revolta do povo, por ocasião da prisão do mestre por Herodes  o grande, objeto da matança procedida por Arquelau, durante a Páscoa, logo após a morte do Pai.)

Essas escolas tinham uma estrutura bastante rudimentar, uma vez que nasciam espontaneamente da decisão que uma pessoa tomava de participar do séqüito de um professor, conviver com ele para, sob sua orientação, dedicar-se ao estudo da Lei. Em geral, esses discípulos passavam vários anos em comunhão com o mestre, enquanto suas esposas, mais ou menos resignadas, permaneciam com os filhos nos vilarejos distantes. Em tais escolas não encontramos apenas jovens desejosos de fazerem carreira: estes eram, provavelmente, uma minoria; o grupo mais vivo era formado pelos discípulos que se dedicavam ao estudo da Tora sem nenhuma outra finalidade. Estes se pareciam mais com os discípulos de Jesus: como eles, haviam deixado tudo, porque estavam fascinados e atraídos pela palavra de Deus.

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