Revista Espírita de Allan Kardec
Fevereiro, 1858
PRIMEIRA ORDEM ESPÍRITOS PUROS
Caracteres gerais. É nula a influência da matéria. Absoluta superioridade intelectual e moral em relação aos Espíritos de outras ordens.
Classe única. Percorreram todos os graus da escala e se despojaram de todas as impurezas da matéria. Tendo atingido a suprema perfeição de que é susceptível a criatura, não têm que passar por provas nem por expiações. Não mais sujeitos à encarnação em corpos perecíveis, têm a vida eterna que se realiza no seio de Deus.
Desfrutam uma felicidade inalterável, pois já não se acham sujeitos às necessidades nem às vicissitudes da vida material; mas uma tal felicidade não é uma ociosidade monótona passada numa contemplação perpétua. São os mensageiros e os ministros de Deus, cujas ordens executam para a manutenção da harmonia universal. Comandam todos os Espíritos que lhes são inferiores, ajudam o seu aperfeiçoamento e lhes ensinam as tarefas. Assistir aos homens em suas angústias excitá-los ao bem ou à expiação das faltas que os afastam da suprema felicidade é-lhes agradável ocupação. Por vezes são designados sob o nome de anjos, arcanjos ou serafins.
Os homens podem entrar em comunicação com eles, mas seria presunção pensar que os temos sempre às nossas ordens (1).
(1) Esta classificação foi ligeiramente alterada por Allan Kardec, quando deu forma definitiva ao Livro dos Espíritos como se pode ver da 22.ª edição francesa, Livro II, Cap. I ns. 101 a 113. Aí as classes são dez: Espíritos impuros, levianos, pseudo-sábios, neutros, batedores e perturbadores, na terceira ordem; as outras ordens não sofreram modificações. (N. do T.)
SEGUNDA ORDEM BONS ESPÍRITOS
Caracteres gerais. Predominância do Espírito sobre a matéria; desejo do bem. As qualidades e a capacidade de fazer o bem são proporcionais ao grau atingido: uns têm ciência; outras sabedoria e bondade; os mais adiantados reúnem o saber às qualidades morais. Como não se acham completamente desmaterializados, conserva mais ou menos, conforme sua classe, os traços da existência corporal, tanto na forma da linguagem quanto nos hábitos, onde chegamos, mesmo, a descobrir certas manias, sem o que seriam Espíritos perfeitos.
Compreendem Deus e o infinito e já desfrutam a felicidade dos bons. Sentem-se felizes pelo bem que praticam e pelo mal que impedem. O amor que os une lhes é uma fonte de inefável felicidade, que não é alterada nem pela inveja ou os pesares, nem pelos remorsos ou quaisquer outras más paixões que atormentam os Espíritos imperfeitos; mas todos têm ainda que passar por provas antes de atingirem à perfeição absoluta.
Como Espíritos, suscitam bons pensamentos, desviam os homens do mal, protegem em vida os que se tornam dignos dessa proteção e neutralizam a influência dos Espíritos imperfeitos sobre aqueles que não se comprazem em suportá-la.
Aqueles em quem encarnam são bons e benevolentes para com os seus semelhantes; não se movem por orgulho ou egoísmo, nem pela ambição; não experimentam ódio, rancor, inveja ou ciúme e fazem o bem pelo bem.
A esta ordem pertencem os Espíritos designados nas crenças vulgares como bons gênios, gênios protetores, Espíritos do bem. Nos tempos de superstição e de ignorância foram transformados em divindades benfazejas.
Também podem ser divididos em quatro grupos principais:
Quinta classe. ESPÍRITOS BENEVOLENTES. A bondade é sua qualidade predominante; gostam de servir aos homens e os proteger, mas seu saber é limitado: seu progresso foi realizado mais no sentido moral que intelectual.
Quarta classe. ESPÍRITOS CULTOS. O que principalmente os distingue é a extensão dos conhecimentos. Preocupam-se menos com as questões morais do que com as científicas, para as quais têm maior aptidão; mas só encaram a ciência do ponto de vista da utilidade, nela não misturando nenhuma das paixões características dos Espíritos imperfeitos.
Terceira classe. ESPÍRITOS SÁBIOS. Seu caráter distintivo são as qualidades morais da mais elevada ordem. Seus conhecimentos não são ilimitados, mas são dotados de uma capacidade intelectual que lhes dá um juízo seguro sobre os homens e as coisas.
Segunda classe. ESPÍRITOS SUPERIORES. Reúnem ciência, sabedoria e bondade. Sua linguagem só respira benevolência; constantemente digna, elevada, por vezes é sublime. Sua superioridade os torna, mais que os outros, aptos para nos darem as mais justas noções sobre as coisas do mundo incorpóreo, nos limites de conhecimento permitidos ao homem. Comunica-se de boa vontade com aqueles que de boa fé procuram a verdade e cuja alma é bastante desprendida dos laços terrenos para a compreender, mas afasta-se dos que são animados pela curiosidade ou desviados da prática do bem pela influência da matéria.
Quando, excepcionalmente, se reencarnam na Terra, é para executarem missão de progresso:
então oferecem o tipo da perfeição que aqui pode aspirar a Humanidade.
TERCEIRA ORDEM ESPÍRITOS IMPERFEITOS
Caracteres gerais. Predominância da matéria sobre o Espírito; propensão para o mal; ignorância, orgulho, egoísmo e todas as más paixões que lhes são conseqüentes.
Têm a intuição de Deus, mas não o compreendem.
Nem todos são essencialmente maus; uns têm mais leviandade, inconseqüência e malícia que verdadeira maldade. Outros nem fazem o bem nem o mal; mas pelo simples fato de não fazerem o bem, revelam inferioridade. Outros, ao contrário, alegram-se no mal e ficam satisfeitos quando encontram ocasião de o praticar.
Podem aliar a inteligência à maldade ou à malícia; mas, seja qual for o seu desenvolvimento intelectual, suas idéias são pouco elevadas e seus sentimentos mais ou menos abjetos.
Seus conhecimentos sobre as coisas do mundo espírita são limitados e o pouco que sabem se confunde com idéias e preconceitos da vida corpórea. Só nos podem dar noções falsas e incompletas; mas o observador atento descobre muitas vezes em suas comunicações, mesmo imperfeitas, a confirmação das grandes verdades ensinadas pelos Espíritos superiores.
Seu caráter é revelado pela linguagem. Todo Espírito que, nas comunicações, trai um mau pensamento, pode ser classificado na terceira ordem; por conseguinte, todo mau pensamento que nos
for sugerido virá de um Espírito dessa ordem.
Vêem a felicidade dos bons e isto lhes é um tormento incessante, pois experimentam todas as
angústias produzidas pela inveja e pelo ciúme.
Conservam a lembrança e a percepção dos sofrimentos da vida corpórea e tal impressão é por vezes mais penosa que a realidade. Sofrem, pois, realmente, os males que suportaram e os que fizeram os outros sofrer; e como sofrem longo tempo, julgam sofrer sempre. Para os castigar, quer Deus que assim o pensem.
Podem ser divididos em quatro grupos principais:
Nona classe. ESPÍRITOS IMPUROS. Inclinados ao mal, objeto de suas preocupações. Como Espíritos, dão conselhos pérfidos, insuflam a discórdia e a desconfiança e tomam todas as máscaras para melhor enganar. Ligam-se aos caracteres suficientemente fracos para cederem às suas sugestões, a fim de os levar à perdição, satisfeitos por poderem retardar o progresso, fazendo-os sucumbir nas provas que enfrentam.
Nas manifestações, se lhes reconhece a linguagem: a trivialidade, a grosseria das expressões,
nos Espíritos como nos homens, são sempre índices de inferioridade morais, senão intelectual. Suas comunicações revelam a baixeza de suas inclinações e se procuram enganar, falando de uma maneira sensata, eles não podem por muito tempo representar o papel e acabam sempre revelando sua origem.
Certos povos os fizeram divindades malfazejas; outros os designam como demônios, gênios do mal ou Espíritos do mal.
Quando encarnados, os seres vivos que animam são inclinados a todos os vícios que geram as paixões vis e degradantes: a sensualidade, a crueldade, a trapaça, a hipocrisia, a cupidez e a avareza sórdida.
Fazem o mal por prazer, o mais das vezes sem motivo e, pelo ódio ao bem, quase sempre elegem suas vítimas entre gente de bem. São flagelos para a Humanidade, seja qual for a classe a que
pertençam e o verniz da civilização não os isenta do opróbrio e da ignomínia.
Oitava classe. ESPÍRITOS LEVIANOS. São ignorantes, malévolos, inconseqüentes e zombeteiros.
Metem-se em tudo, a tudo respondem sem preocupação da verdade. Gostam de causar pequenos aborrecimentos e pequenas alegrias, de produzir discórdias, de induzir maliciosamente em erro por mistificações e por travessuras. A esta classe pertencem os Espíritos vulgarmente designados sob os nomes de duendes, diabretes, trasgos, gnomos. Estão sob a dependência de Espíritos superiores, que muitas vezes os empregam como nós o fazemos com os criados e os operários.
Mais que os outros, parecem ligados à matéria e ser os principais agentes das vicissitudes dos elementos do globo, quer vivam no ar, na água, no fogo, nos corpos sólidos ou nas entranhas da Terra.
Muitas vezes manifestam sua presença por efeitos sensíveis, tais como pancadas, movimento e deslocamento anormal dos corpos sólidos, agitação do ar, etc., o que lhes valeu o nome de Espíritos batedores. Reconhece-se que tais fenômenos não são devidos a uma causa fortuita e natural quando têm um caráter intencional e inteligente. Todos os Espíritos podem produzir esses fenômenos, mas os Espíritos elevados em geral relegam essas atribuições aos inferiores, mais aptos para as coisas materiais que para as inteligentes.
Em suas comunicações com os homens, sua linguagem é por vezes espirituosa e alegre, mas
quase sempre sem profundeza. Apreendem os caprichos e o ridículo, que exprimem em traços
mordazes e satíricos. Se por vezes tomam nomes supostos é mais por malícia que por maldade.
Sétima classe. ESPÍRITOS PSEUDO-SÁBIOS. De conhecimentos bastante extensos, julgam saber mais do que sabem. Tendo feito algum progresso sob vários pontos de vista, sua linguagem tem um caráter sério e pode levar a enganos quanto à sua capacidade e às suas luzes; mas muito comumente é simples reflexo dos preconceitos e das idéias sistemáticas da vida terrena: é a mistura de algumas verdades ao lado dos maiores absurdos, em cujo meio sobressai a presunção, o orgulho, a inveja e a teimosia, de que não se despojaram.
Sexta classe. ESPÍRITOS NEUTROS. Nem são bastante bons para fazer o bem, nem bastante maus para fazer o mal: inclinam-se para um ou para o outro e não se alçam acima do vulgar na Humanidade, tanto para o moral quanto para a inteligência. Apega-se às coisas do mundo, de cujas alegrias grosseiras têm saudades.
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