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quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O LIVRO DOS ESPÍRITOS *Estudo de: Eurípedes Kühl

PARTE TERCEIRA - Das leis morais

CAPÍTULO XII — DA PERFEIÇÃO MORAL - (questões 893 a 919)

12.1 – As virtudes e os vícios - (questões 893 a 906)

 Falar em virtudes é falar de anjos — ambos se confundem.

 Para tanto, todo respeito, reflexões demoradas, gratidão eterna.

 Definir virtude será exercício sempre inacabado. Contudo, se imaginarmos que a virtude é a representação do Bem, não estaremos muito longe de entendimento, desde que considerando que o Bem é vitoriosa resistência ao mal.

 Virtude sublime exerceremos quando atendermos ao próximo, sem qualquer interesse que não seja o de ajuda, assim procedendo até mesmo com sacrifício próprio, se necessário.

Praticar o bem — ser caridoso — sempre é resultante de acerbos combates contra o egoísmo... Guerrear os próprios vícios é evoluir e aproximar-se de Deus.

 O patrimônio moral de um Espírito pode ser avaliado pela ausência ou prática de ação caridosa na sua vida. E se não for desinteressada, permanente, espontânea e anônima, não será ação caridosa.

 Outro indicativo de evolução é seguramente o desapego dos bens materiais.

 Doar irrefletidamente não significa posse de virtude. Não deixa de haver algum merecimento, pelo bem que vier a ser produzido, contudo, expõe mau zelo com a confiança ou responsabilidade de que seja depositário.

 Não se configura um mal a caridade que trilha por desinteresse material, mas que, no fundo, se reveste da intenção de recompensa no plano espiritual. Com toda certeza há aferição divina de intenções em tudo o que fazemos e dessa forma ideal seria a prática caridosa sem idéia pré-concebida de dividendos celestiais. Terão maior recompensa aqueles que fazem o bem infensos à expectativa de qualquer retorno, neste ou no plano espiritual, ciosos de que apenas Deus contempla suas ações.

 A busca de conhecimentos científicos é meritória e faz com que a inteligência se aprimore cada vez mais, disso decorrendo que quanto mais o homem conhece, mais se aproxima da Natureza, que em última análise, é a grande professora da Vida. Tudo o que o homem sabe aprendeu com ela! Tudo!

 Um fato é óbvio: aquele que detém muitos conhecimentos não tarda a perceber que pela prática do amor ao próximo mais e mais se aproximará da felicidade. Assim agir será decisão exclusiva dele próprio.

 Ademais, só tudo sabendo um Espírito será perfeito.

 OBS: À questão 899 nos deparamos com uma proposição interessante:

 Dois ricos: um assim nascido e o outro nasceu pobre e depois enriqueceu. Ambos utilizam a fortuna a benefício próprio. Qual o mais culpado?...

 — O que você responderia, caro leitor?

 — Eu consignei que ambos, mas os Espíritos responderam a Kardec, com o ajuizamento superior que detêm, que o segundo é mais culpado, pois o primeiro desconheceu a dor da pobreza, ao passo que este, dela se esqueceu...

 Mal procede aquele que só pensa em acumular riquezas para legá-las aos herdeiros. Imaginando que bem procede, na verdade desliza pelo egoísmo.

 OBS: À questão 901 somos colocados diante de outra proposição intrigante:

 Dois avarentos: um nega até a si mesmo qualquer conforto e morre na miséria; o outro só é generoso para consigo mesmo, jamais fazendo favor para quem quer se seja, no entanto, dando-se a fantasias e luxos exagerados. Outra vez a mesma pergunta: qual o mais culpado e qual se achará em pior condição no mundo dos Espíritos?

 Responda, querido leitor...

 Pois é: dessa vez eu não arrisquei. Responderam os Instrutores Celestiais de Kardec que o segundo, eis que o primeiro já foi parcialmente castigado pelo próprio procedimento...

 Almejar a riqueza para com ela fazer o bem... “Há alguém aí?”

 Na Terra somos todos inquilinos de uma moradia de provas e expiações...

 Como tal, imperfeitos. Ainda...

 — Do que aproveitará descobrirmos erros alheios?

 — Um único: não cometê-los. Dito de outra forma: identificando o orgulho em alguém, impregnando nosso viver de humildade; captando mentira nas palavras de quem quer que seja, passando só a dizer verdades; se considerarmos alguém avarento, áspero, falso, tudo fazer para ser pródigo, cordial, autêntico.

 Escritores, modo geral, se provocam escândalos, por eles responderão. Ao contrário, se de seus escritos resultam bem, isso só será convertido em mérito para eles se procederem como escrevem. Se registram o bem, bem devem proceder...

 É bom, logo útil, o indivíduo auto-identificar procedimentos, no bem ou no mal para, no primeiro caso, disso não se envaidecer e no segundo, coibi-lo.

12.2 – Paixões - (questões 907 a 912)

 Estamos novamente diante de dificuldade interpretativa. Agora é referente à paixão... Segundo os dicionários ela é “sentimento ou emoção levados a um alto grau de intensidade, sobrepondo-se à lucidez e à razão; amor ardente, afeto dominador e cego; desgosto, mágoa, sofrimento. Nos Evangelhos é descrita como o sofrimento dos santos, particularmente a Paixão do Cristo”.

 Na verdade, a paixão é um sentimento nato, acoplado à alma para o bem, mas que exige temperança e controle absoluto na administração do que dela se depreende.

 Enquanto sentimento com aura celestial é poderosa força, capaz de impulsionar a criatura a feitos extraordinários, via de regra a benefício de outrem. Imbuído desse impulso e na obra que realiza o ser é, por assim dizer, um agente de Deus, já que seus feitos obedecem aos processos dos desígnios da Providência. E nessas horas o amparo do mais Alto estará arrimando-o, invariavelmente.

 Já o excesso passional terreno, que sempre trilha pelo abuso, desemboca em prejuízo (como, aliás, ocorre com qualquer excesso). E tal prejuízo não alcança apenas o agente, mas quase sempre, os que estão à sua órbita de vida, não apenas encarnados...

 OBS: Retornando à questão 459 deste livro, temos patente que quase sempre temos companhias espirituais, que chegam até mesmo a nos dirigir. No caso da paixão fugir ao nosso controle, não objeta refletir que Espíritos pouco esclarecidos, ultra-apaixonados por causas infelizes, podem estar no governo de nossos atos, mergulhados tanto quanto nós em paixões avassaladoras. Na hipótese, usam-nos como intermediários, apossando-se das ensandecidas vertigens resultantes. Nesse contexto somos infelizes nós e eles, restando desestruturados e devedores morais, por termos nos associado e ofertado inconscientemente canal e vazão de sensações menos nobres, fugazes.

 A vontade é a mais poderosa ferramenta que o homem possui, e que o acompanha permanentemente. É por ela que o ser se liberta de todos os vícios, supera todas as tendências negativas, desenvolve e incorpora à sua vida a prática constante das virtudes. Vetor principal na subida evolutiva: a vontade!

12.3 – O egoísmo - (questões 913 a 917)

 Em termos radicais o egoísmo é, de longe, o pior dos vícios.

 É corrosivo potente de todas as virtudes.

 Absolutamente incompatível com a justiça, o amor e a caridade.

 Tudo que no mundo atrai e excita a alma, gerando desejo de posse material tende a impedir a evolução espiritual. E são tantas essas tentações terrenas...

 O problema não é do planeta Terra e sim dos homens que nele habitam, cuja maioria está longe do desprendimento integral dos bens terrestres.

 OBS: Todos os bens materiais são efêmeros. Uma simples reflexão demonstra a veracidade dessa assertiva: onde está a casa mais luxuosa de mil anos atrás? O traje mais luxuoso do mundo manufaturado há duzentos anos como está? Onde está o automóvel mais luxuoso fabricado há cem anos? Onde está a primeira cabeça da coroa mais valiosa do mundo? E onde está o primeiro dedo do anel mais valioso do mundo? Quanto de ouro há no plano espiritual?

 A posse de bens é característica primitiva do homem e persiste.

 Não há escape: só compenetrando-se o indivíduo da importância da vida moral ele automaticamente se desvencilhará dos arrastamentos da material. E esse entendimento religião alguma oferta com tanta lógica quanto o Espiritismo, daí que não será presunção supor que a regeneração planetária a ele se condiciona.

 Obvio que muitos são os homens abnegados e desprendidos, não necessariamente espíritas ou sequer conhecedores das lições evangélicas. O que se enfatiza é que a Doutrina dos Espíritos faculta à razão compreender o porquê da existência física, que se desdobra em muitas etapas reencarnatórias, enaltecendo o valor ímpar da evolução e da vida espiritual, imensamente mais valiosa que a atual (terrena).

 Na educação do espírito reside a extirpação do egoísmo da Humanidade.

 Se o egoísmo é a fonte de todos os vícios a caridade o é de todas as virtudes.

12.4 – Caracteres do homem de bem - (questão 918)

 Um Espírito evoluído será reconhecido quando nenhum dos seus atos na vida corporal não contrariarem a lei de Deus e, estando encarnado, compreender a vida espiritual.

 Eis como age o homem de bem:

   pratica a lei de justiça, amor e caridade, com integral pureza;

   está sempre perguntando à consciência se não terá, algures, transgredido essa lei;

   ajuíza que, se não fez o mal, teria feito todo o bem que podia?...

   interroga-se quanto à eventual existência de alguém com queixas a seu respeito;

   pergunta-se ainda: o que vem fazendo é o mesmo que desejaria que lhe fizessem?

   por caridade e amor faz o bem pelo bem, sem almejar retribuição;

   sacrifica seus interesses à justiça;

   usa de bondade, humanitarismo e benevolência para com todos;

   vê irmãos nos homens de todas as crenças e raças, conhecidos ou não;

   se detém poder e riqueza atribui a posse disso a Deus, por empréstimo temporário e com destinação exclusiva à prática do bem;

   se detém chefia é bondoso para com os auxiliares, aos quais jamais subjuga;

   jamais condena, por saber-se também frágil e passível de falhas;

   o perdão é sua resposta para qualquer ataque, fixando-se só em benefícios;

   mantém integral respeito ao próximo, a quem considera exatamente igual a ele quanto aos direitos naturais.

12.5 – Conhecimento de si mesmo - (questão 919)

 A melhor maneira de evoluir e de resistir à atração do mal é o conhecimento de si mesmo.

 “Conhece-te a ti mesmo”, proclamava o filósofo grego Sócrates.

 — Isso é fácil?

 — De forma alguma: ao contrário, talvez seja a atitude mais difícil da vida.

 Santo Agostinho, um dos Espíritos que arrimaram Kardec na elaboração deste livro, oferta longa reflexão à presente questão e dá conselhos. Vou sintetizar:

   ao fim de cada dia interrogar à consciência se fez algo errado ou magoou alguém;

  nesse repasse feito a cada noite, orar a Deus e ao anjo da guarda implorando auxílio para autodefinir se suas ações daquele dia foram boas ou más;

   nessas ações não mascarar a avareza de previdência; não se imaginar a única pessoa digna no mundo; delas o que pensam os amigos e principalmente os inimigos?

   imaginar se determinadas ações fossem feitas por outrem não teriam sua própria condenação...

   se desencarnasse agora: ao chegar ao plano espiritual não temeria encarar alguém “olho no olho”?

   desse balanço moral, diário, sobre perdas ou lucros, dependerá dormir em paz e a segurança de que quando atravessar “o grande rio da Vida” lá despertar bem.

 OBS: Kardec, seguro, pragmático (aqui entendido como aquele que “ toma o valor prático como critério da verdade”) e sensato como sempre, encerra essa questão enfatizando respostas do tipo “sim” ou “não” para as interrogações que fizermos à consciência, tomando especial cuidado em não esconder ou dissimular algumas das nossas atitudes, quase sempre faltosas...

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