MARLENE FAGUNDES CARVALHO GONÇALVES
de Ribeirão Preto, SP
"O amor (…), esse sol interior, que reúne e condensa em seu foco ardente todas as aspirações e todas as revelações sobre-humanas". ¹
Temos aprendido na Doutrina Espírita que todos nós trazemos, no fundo de nossas almas, o amor, talvez de forma ainda incipiente, mas já presente, como legado de Deus para nós, seus filhos. Fenélon, no Evangelho Segundo o Espiritismo, diz que "O amor é essência divina. Desde o mais elevado até o mais humilde, todos vós possuís, no fundo do coração, a centelha desse fogo sagrado." ²
Falta-nos, então, saber como alimentar tal centelha, como transformá-la naquele sol interior que nos aproxima de nossos semelhantes, permitindo-nos sentir uma felicidade e a sensação de proximidade com Deus. Como transformar aquele amor egoísta por nossos filhos e familiares, ou até mesmo por nossas coisas materiais, num amor poderoso, capaz de transformar o mundo?
Humberto de Campos, no maravilhoso livro Boa Nova ³, traz algumas lições que ele próprio diz ter aprendido em uma das Escolas do Evangelho, no plano espiritual. Dos milhares de episódios que por lá circulam, sobre a passagem de Jesus na Terra, ele apresenta trinta casos, repletos de ensinamentos. A síntese de todos eles: o amor.
Mas vamos refletir sobre um episódio especial, que traz essa lição de amor com extrema beleza: Maria.
O autor conta que Maria estava ao pé de Jesus, na cruz, no momento extremo de sua agonia. Ela relembrava todos os momentos por que passara junto àquele que deu à vida por todos nós: lembrava do seu nascimento, de sua infância, do amor infinito que ele trazia a todos. Embora resignada e aceitando a vontade de Deus, em seu íntimo sofria ao ver tal agonia. João, o apóstolo, junto a ela, buscava também a luz do olhar do Mestre querido, ambos em profundo desalento. "– Meu filho! Meu amado filho!… – exclamou a mártir, em aflição diante da serenidade daquele olhar de melancolia intraduzível. O Cristo pareceu meditar no auge de suas dores, mas, como se quisesse demonstrar, no instante derradeiro, a grandeza de sua coragem e a sua perfeita comunhão com Deus, replicou com significativo movimento dos olhos vigilantes: – Mãe, eis aí teu filho!… – E dirigindo-se, de modo especial, com um leve aceno, ao apóstolo, disse: – Filho, eis aí tua mãe!" (Boa Nova, pág. 198) ³.
Maria põe-se a chorar, e João entendeu ali, naquele momento, a lição de Jesus: o amor não deveria restringir-se ao círculo familiar, mas expandir-se para toda humanidade, como amor universal.
Algum tempo depois, sem esquecer daquele momento mágico, João e Maria, como filho e mãe, juntos em Éfeso desenvolveram um trabalho belíssimo. Maria contava a todos suas lembranças da vivência com Jesus, seus exemplos e atitudes. João comentava as lições do evangelho.
Mas, mais que isso, era o amor que estava sendo expandido. Maria era vista como mãe de todos, e assim a chamavam: mãe santíssima. Cada criatura que a procurava com dores, sofrimentos, doenças ou desespero era recebida por ela, que sempre tinha um bálsamo para todos. Aquela confiança filial que lhe dedicavam era um tesouro do coração, trazendo-lhe paz e felicidade. Maria conseguiu ampliar aquele sentimento que nutria por seu filho, alcançando todos aqueles irmãos necessitados que a buscavam.
Ela punha em prática a lição do Evangelho, na qual Fenélon ensina: "para praticar a lei do amor, como Deus a quer, é necessário que chegueis a amar, pouco a pouco, e indistintamente, a todos os vossos irmãos. A tarefa é longa e difícil, mas será realizada. Deus o quer". ²
E nós, que estamos longe ainda de tal modelo de ação e renúncia? Podemos começar devagar, construindo esse amor, através de pequenos atos para com aqueles que não nos são caros ainda, mas que convivem de alguma forma conosco: proporcionando a eles alguma alegria, buscando compreender as razões das suas ações, deixando de ser tão intransigente, e, claro, tentar atender aquela máxima: fazer aos outros aquilo que gostaria que fizessem a você!
Ao provocar essas mudanças, nossas relações com essas pessoas vão se alterando, os nossos sentimentos vão se depurando, o amor vai crescendo e se instalando, nos aquecendo e transformando-se ele próprio naquele foco ardente, capaz de alcançar todos à nossa volta.
Toda mudança exige um tempo, persistência, e trabalho. Por que essa, a mais importante, seria diferente?
Essa tentativa já seria um bom começo para o trabalho de desenvolver aquele germe de amor, depositado em nosso coração. Seria também um primeiro passo para um mundo melhor, pois, como dizia Fenélon ²: "Os efeitos da lei do amor são o aperfeiçoamento moral da raça humana e a felicidade durante a vida terrena (…) Este é um imã a que ele não poderá resistir, e o seu contato vivifica e fecunda os germes dessa virtude, que estão latentes em vossos corações".
Fenélon termina sua mensagem fazendo um apelo: "Queridos irmãos, utilizai como proveito essas lições: sua prática é difícil, mas delas retira a alma imenso benefício. Crede-me, fazei o sublime esforço que vos peço: 'Amai-vos', e vereis, muito em breve, a Terra modificada tornar-se um novo Eliseu, em quem as almas dos justos virão gozar o merecido repouso". ²
Referências Bibliográficas:
1. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XI, item 8.
2. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XI, item 9.
3. XAVIER, Francisco. C., pelo Espírito Humberto de Campos. Boa Nova. FEB. Cap. 30.
Janeiro de 2006, edição n°. 240
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