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sábado, 22 de novembro de 2008

49 - O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

CAPÍTULO V: BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

ITEM 23: OS TORMENTOS VOLUNTÁRIOS


Fénelon, tão conhecido, entre os espíritas, pela sua contribuição na codificação do Espiritismo, foi um prelado e escritor francês, que viveu entre 1651 a 1715. Ordenou-se aos 24 anos. Foi escritor e educador, deixando diversas obras, tais como "De L'éducation des filles" (Da educação das filhas), que se tornou obra de referência para as famílias da época.

Teve uma vida de muito trabalho e atividades, sendo impossível resumir sua vida em poucas linhas.

Para a educação do neto do rei e herdeiro presumido do trono, o jovem duque de Borgonha, de quem fora nomeado preceptor, escreveu "Dialogue des Morts" (Diálogos dos Mortos), no qual dialogavam os personagens históricos do passado. Escreveu também “As Aventuras de Telêmaco".

Pela sua simplicidade, mansuetude, caridade, teve sucesso, em converter pessoas ao catolicismo, tendo trabalhado, durante anos, em uma instituição católica, que tinha por fim consolidar a conversão de jovens e senhoras do protestantismo para o catolicismo, instruindo-as na ortodoxia da igreja, bem como instruir as que estivessem dispostas a abandonar a 'heresia'.

Na época, era grande o interesse das lideranças católicas na 'salvação' das almas que haviam aderido às idéias de Lutero.

Teve algumas polêmicas, pela sua simpatia ao quietismo e sua luta contra os jansenismo.

Seu livro Explicação das Máximas dos Santos, publicado em 1697, foi condenado pelo Vaticano, condenação que ele aceita com humildade.

Hermínio C. Miranda, fez um estudo aprofundado sobre Fénelon, no livro As Sete Vidas de Fénelon, editora Lachâtre, 1998, da página 121 a 174, do qual tirei esses poucos dados, e sua conclusão sobre essa pessoa: "A imagem que a história nos devolve, depois de toda essa elaboração e sedimentação, é a de um homem digno, amável, generoso, culto, dotado de brilhante inteligência, capaz de dialogar com os reis, prelados, intelectuais, mas também com os plebeus, mais ínfimos da cruel escala social da época. Ele gostava de visitar essa gente simples nas suas cabanas e partilhar com ela a refeição frugal e o vinho pobre. Talvez fosse um tantinho orgulhoso de seu status nobiliárquico e eclesiástico. Fazendo-o, mantinha-se perfeitamente cônscio de seus dotes de inteligência, cultura e finesse".

Participou com muitos outros, através de mensagens mediúnicas, na codificação do espiritismo, estando em diversos livros de Allan Kardec.

Em O Livro dos Espíritos, aparece nos Prolegômenos como um dos integrantes da equipe incumbida de assistir Kardec, é citado por este, no módulo XII da Introdução, no 1º e no penúltimo parágrafo, e é de sua responsabilidade a resposta à questão número 917.

Em O Livro dos Médiuns, está na Segunda Parte, no capítulo XXXI, itens XXI e XXII.

Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, apresenta-se no capítulo I, item 10, no capítulo V, itens 22 e 23, no capítulo XI, 9, no capítulo XII, 10 e no capítulo XVI, 13.

Em O Céu e o Inferno, na Primeira parte, Kardec cita Fénelon e seu livro Aventuras de Têmaco, em Quadro do Inferno Pagão, itens 9 e 10.

Na Revista Espírita, (Edicel, 1965), Fénelon aparece com seis mensagens: a primeira na de abril de 1860, à página 128, a segunda e a terceira, respectivamente, na de julho de 1861, página 238 e na de outubro, página 229. Esta última está também em O Evangelho Segundo o Espiritismo: Um Homem de Bem teria morrido. A quarta, na de fevereiro de 1863, pág. 60; a quinta, em janeiro de 1865, pag. 29 a 31e a sexta em fevereiro de 1868, pag. 46.

Quem se interessar pela mensagem de 1868, que está junto com outras sobre o mesmo tema, não deve deixar de ler o comentário de Kardec na Revista Espírita de março do mesmo ano.

Nesta mensagem do livro que estudamos, Fénelon refere-se aos tormentos, ou seja, aos sofrimentos, às privações, às penas, dores, aflições, torturas, inquietações, que sofre o homem, como conseqüências das ações negativas, na busca da sua felicidade.

Uma vez mais, vemos a idéia de que na Terra não existe felicidade sem mescla, visto ser nosso mundo, moradia de espíritos rebeldes às leis do bem e do amor; mundo este, onde, com todo o desenvolvimento intelectual já alcançado, a guerra entre povos e até entre irmãos de um mesmo país, se constitui um recurso para resolver-se discordâncias, desavenças, agressões...

Pode o homem terreno gozar de uma felicidade relativa, que vem da "paz do coração", da consciência do dever cumprido, da busca do entendimento das diferenças de idéias, usos e costumes, no respeito aos outros, no exercício das leis e da justiça, sem colocar-se como acusador e juiz dos seus irmãos, auxiliando-os nas necessidades físicas e morais, ou seja, fazendo ao outro o que desejaria lhe fizessem, como asseverou Jesus.

Na busca porém, dos prazeres materiais, que lhe satisfazem o orgulho, a vaidade, a ambição, dando-lhe uma sensação de felicidade momentânea e ilusória, cria o homem aflições e sofrimentos, dos quais não precisaria, se houvesse buscado a felicidade nas coisas que levará consigo após a morte do corpo físico.

Fénelon cita, como exemplo, os tormentos causados pela inveja e o ciúme, lembrando que quem os tem e os alimenta, não tem repouso, sofre insônias, procurando meios de ofuscar o outro, de sobrepujá-lo, procurando causar-lhe sofrimentos, despertando-lhe também, a cólera da inveja e do ciúme.

Esses sofrimentos, essas aflições, não estão enquadrados na afirmação de Jesus: "Bem-aventurados os aflitos porque serão consolados", visto que são causados por sentimentos e emoções negativos, gerando conseqüências também negativas: são tormentos voluntários, criados por quem os sente.

Bem-aventurados são os aflitos que sofrem as conseqüências dos seus desvios e equívocos, sem reclamar, sem culpar outros, considerando-os justos, procurando aceitá-los, confiantes no amor e na justiça divina, sem provocar outros males, e esforçando-se por combater as causas que lhes deram origem. Estes serão consolados aqui, na Terra e no além-túmulo.

Fénelon nos mostra ainda, quantos tormentos evita a pessoa que vive feliz com o que possui, que vê sem inveja o que não lhe pertence, que se contenta com o necessário, consciente de que existem muitos que estão em situações piores do que a sua.

Este está sempre rico, visto que se satisfaz com o necessário para uma vida digna, na qual pode com mais facilidade, desenvolver as faculdades e qualificações do espírito, satisfazendo suas necessidades, engrandecendo-se na aquisição dos valores espirituais, que levará consigo, após a morte do corpo físico: os tesouros que a traça e a ferrugem não corroem, nem os ladrões escavam e roubam, conforme disse Jesus (Mateus, 6: 20).

Poderíamos ainda perguntar: se esses tormentos vividos como conseqüências da vontade do ser, no uso do seu livre-arbítrio, são considerados voluntários, existem os involuntários? Penso que sim. São aqueles que acontecem como conseqüência do próprio viver em um mundo imperfeito, que está também em desenvolvimento.

Por isso, vemos homens de bem, no sentido evangélico, missionários, sofrendo vicissitudes próprias da imperfeição desta humanidade e do planeta, mostrando-se como exemplos, na maneira como reagem a elas.

Desses, Jesus foi e continua sendo o maior exemplo.

Leda de Almeida Rezende Ebner

Junho / 2005

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