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quinta-feira, 6 de novembro de 2008

DA PERPETUALIDADE DO ESPIRITISMO

Revista Espírita, Fevereiro de 1865.

 

Num artigo anterior falamos dos incessantes progressos do Espiritismo. Serão esses progressos duráveis ou efêmeros? É um meteoro que brilha com luz passageira, como tantas outras coisas? É o que vamos examinar em poucas palavras.

Se o Espiritismo fosse uma simples teoria, uma escola filosófica fundada numa opinião pessoal, nada garantiria a sua estabilidade, porque poderia agradar hoje e não agradar amanhã; num dado tempo poderia não estar mais em harmonia com os costumes e o desenvolvimento intelectual e, então, cairia, como todas as coisas velhas, que ficam para trás do movimento; enfim poderia ser substituído por algo de melhor. Assim é com todas as concepções humanas, todas as legislações e todas as doutrinas puramente especulativas.

O Espiritismo apresenta-se em condições completamente outras, como tantas vezes temos feito observar. Repousa sobre um fato, o da comunicação entre o mundo visível e o invisível. Ora, um fato não pode ser anulado pelo tempo, como uma opinião.

Sem dúvida ainda não é admitido por todos. Mas que importam as negações de alguns, quando ele é constatado diariamente por milhões de indivíduos, cujo número cresce incessantemente, e que nem são mais tolos, nem mais cegos que outros? Virá, pois, um momento em que não encontrará mais negadores do que os que há atualmente do movimento da terra.

Quanta oposição não levantou este último fato! Há quanto tempo faltam aos incrédulos boas razões aparentes para o contestar. “Como crer, diziam eles, na existência dos antípodas, marchando de cabeça para baixo? E se a terra gira, como pretendem, como crer que nós mesmos estejamos, de vinte e quatro em vinte e quatro horas, nessa posição incômoda sem nos apercebermos?” Nesse estado, não mais poderíamos ficar ligados à terra senão quiséssemos marchar contra o fecto, com os pés no ar, à maneira de moscas. E depois, que aconteceria aos mares? Será que a água não se derrama quando se inclina o vaso? A coisa é simplesmente impossível, portanto é absurda, e Galileu é um louco.”

Entretanto, sendo um fato essa coisa absurda, triunfou de todas as razões contrarias e de todos os anátemas. Que faltava para admitir a sua possibilidade? O conhecimento da lei natural sobre a qual ela repousa. Se Galileu se tivesse contentado com dizer que a terra gira, ainda agora não o acreditariam. Mas as denegações caíram ante o conhecimento do princípio. Será o mesmo com o Espiritismo. Desde que repousa sare um fato material, existente em virtude de uma lei explicada e demonstrada, que lhe tira todo caráter sobrenatural e maravilhoso, é imperecível. Os que negam a possibilidade das manifestações estão no mesmo caso dos que negaram o movimento da terra. A maioria nega a causa primeira, isto é, a alma, sua sobrevivência e sua individualidade. Então não é de surpreender que neguem o efeito. Julgam pelo simples enunciado do fato, e o declaram absurdo, como outrora declaravam absurda a crença nos antípodas. Mas, que pode sua opinião contra um fenômeno constatado pela observação e demonstrado por uma lei da natureza? Sendo o movimento da terra um fato puramente cientifico, sua demonstração não estava ao alcance do vulgo; foi preciso aceitá-lo sobre a fé nos cientistas. Mas o Espiritismo tem a mais, por si, poder ser constatado por todo o mundo, o que explica sua rápida propagação.

Toda descoberta nova de alguma importância tem conseqüências mais ou menos graves. A do movimento da terra e da lei da gravitação, que rege esse movimento as teve e incalculáveis. A ciência viu abrir-se à sua frente um novo campo de exploração e não se poderiam enumerar todas as descobertas, as invenções e as aplicações que foram sua conseqüência. O progresso da ciência acarretou o da indústria, e o progresso da indústria mudou a maneira de viver, os hábitos, numa palavra todas as condições de ser da humanidade. O conhecimento das relações do mundo visível e do mundo invisível tem conseqüências ainda mais diretas e mais imediatamente práticas, porque está ao alcance de todas os individualidades e do interesse de todos. Devendo cada homem necessariamente morrer, ninguém pode ser indiferente ao em que se transformará após a morte. Pela certeza que o Espiritismo dá do futuro, muda a maneira de ver e influi sobre a moralidade. Abafando o egoísmo, modificará profundamente as relações sociais de indivíduo a indivíduo e de povo a povo.

Muitos reformadores de pensamento generoso formularam doutrinas mais ou menos sedutoras; mas, em sua maioria, apenas tiveram um sucesso de seita, temporário e circunscrito. Foi assim e assim será sempre com as teorias puramente sistemáticas, porque na terra não é dado ao homem conceber algo de completo e perfeito. Ao contrário, o Espiritismo, apoiando-se não numa idéia preconcebida, mas em fatos patentes, está ao abrigo dessas flutuações e não poderá senão crescer, à medida que os fatos forem vulgarizados, melhores conhecidos e melhor compreendidos Ora, nenhuma força humana poderia impedir a vulgarização de fatos que cada um pode constatar. Constatados os fatos, ninguém poderá impedir as conseqüências dos mesmos resultantes. Estas conseqüências são aqui uma revolução completa nas idéias e na maneira de ver as coisas deste mundo e do outro. Antes que este século tenha passado ela será realizada.

Mas, dirão, ao lado dos fatos tendes uma teoria, uma doutrina; quem vos diz que essa teoria não sofrerá variações? Que em alguns anos a de hoje será a mesma?

Sem dúvida ela pode sofrer modificações em seus detalhes, à vista de novas observações; mas, uma vez adquirido o princípio, não pode variar e, menos ainda, anular-se; é o essencial. Desde Copérnico e Galileu tem-se calculado melhor o movimento da terra e dos astros, mas o fato do movimento ficou com o princípio.

Dissemos que o Espiritismo é, antes de tudo, uma ciência de observação. É o que faz a sua força contra os ataques de que é objeto e dá aos seus adeptos uma fé inquebrantável. Todos os raciocínios que lhe opõem caem diante dos fatos, e esses raciocínios têm tanto menos valor aos seus olhos quanto mais os sabem interesseiros. Em vão se lhe diz que isto não é, ou é outra coisa. Respondem: Não podemos negar a evidência. Ainda quando se tratasse de um só, poderia julgar-se vítima de uma ilusão; mas quando milhões de indivíduos vêem a mesma coisa, em todos os países, conclui-se logicamente que são os negadores que abusam.

Se os fatos espíritas só tivessem como resultado satisfazer a curiosidade, certamente ocasionariam apenas uma preocupação momentânea, como tudo o que é inútil; mas as conseqüências que deles decorrem tocam o coração os torna felizes, satisfazem as aspirações, enchem o vazio cavado pela dúvida, lançam a luz sobre a temível questão do futuro; ainda mais, neles se vê uma causa poderosa de moralização para a sociedade; elas têm, pois, um grande interesse. Ora, a gente não renuncia facilmente ao que é uma fonte de felicidade. Certamente não é com a perspectiva do nada, nem com a das chamas eternas que arrancarão os Espíritas de sua crença.

O Espiritismo não se afastará da verdade e nada terá a temer das opiniões contraditórias, enquanto sua teoria cientifica e sua doutrina moral for uma dedução dos fatos escrupulosa e conscientemente observados, sem preconceitos nem sistemas preconcebidos. É diante de uma observação mais completa que todas as teorias prematuras e aventurosas, surgidas na origem dos fenômenos espíritas modernos, caíram e vieram fundir-se na imponente unidade que hoje existe, e contra a qual só se atiram raras individualidades, que diminuem dia a dia. As lacunas que a teoria atual pode ainda conter encher-se-ão da mesma maneira. O Espiritismo está longe de haver dito a última palavra, quanto às suas conseqüências, mas é inamolgável em sua base, porque esta base está assentada nos fatos.

Assim, que os Espíritas nada receiem: o futuro lhes pertence; que deixem os adversários se debatendo sob o aperto da verdade, que os ofusca, porque toda denegação é impotente contra a evidência que, inevitavelmente, triunfa pela mesma força das coisas.

É uma questão de tempo, e neste século o tempo marcha a passos de gigante, sob o impulso do progresso.

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